segunda-feira, 14 de dezembro de 2009
TRADICIONALISMO... ou PROGRESSISMO ? FALSAS ALTERNATIVAS (De: Dietrich Von Hildebrand)
Quem lê a luminosa Encíclica Ecclesiam Suam, do Papa Paulo VI, ou a magnífica Constituição Dogmática da Igreja, dos Padres Conciliares, só pode ficar convencido da grandeza do Concílio Vaticano II.
Porém, quando se volta a tantas publicações contemporâneas, algumas delas da autoria de teólogos famosos, outras de teólogos de menor renome, outras ainda de leigos que nos oferecem as suas diletantes elucubrações teológicas, chega-se a ficar profundamente entristecido, e até mesmo refém de graves apreensões.
Será realmente difícil conceber maior contraste do que o existente entre os Documentos oficiais do Vaticano II, e as declarações oficiais insípidas, de vários teólogos e leigos, que têm brotado por toda parte, como verdadeira praga.
De um lado, achamos o verdadeiro Espírito de Cristo, a voz autêntica da Igreja, deparando-nos com textos que, no fundo e na forma, respiram gloriosa atmosfera sobrenatural.
De outro lado, encontramos deprimente secularização, completa perda do 'sensus supernaturalis', um charco de confusões.
A distorção da autêntica natureza do Concílio, produzida por essa epidemia de diletantismo teológico, tem a sua mais forte expressão nas falsas alternativas, as quais nos ordenam a todos escolher: ou aceitar a secularização da Cristandade, ou negar a autoridade do Concílio.
Essas alternativas drásticas e dissidentes são, com bastante frequência, rotuladas de respostas “progressistas” e respostas “tradicionalistas”.
São termos que se aplicam facilmente a muitos domínios naturais, mas podem ser extremamente enganadores quando aplicados à Igreja.
É da própria natureza da Fé cristã e católica aderir à Revelação Divina imutável, reconhecendo que na Igreja há algo que paira acima dos altos e baixos das culturas e do ritmo da História.
A Revelação Divina e o Corpo Místico de Cristo diferem completamente de todas as entidades naturais.
Ser 'conservador' ou ser 'tradicionalista', é neste caso um elemento essencial da resposta que é devida a esse fenómeno original, a Igreja.
Mesmo um homem que não seja, de modo nenhum, conservador por temperamento, mas progressista em muitos outros aspectos, deve ser conservador na sua relação com o Magistério infalível da Igreja, se pretende ser Católico verdadeiro.
É possível ser, ao mesmo tempo, progressista e católico; mas não se pode ser progressista a respeito da Fé católica.
A ideia de “católico progressista”, neste sentido, é uma contradição "in adjecto".
Infelizmente, há muitos que, hoje em dia, já não entendem tal contradição, pelo que orgulhosamente se proclamam “católicos progressistas”.
Com os rótulos de “tradicionalismo” e “progressismo”, realmente colocam os fiéis na situação de ter de escolher entre a oposição a qualquer renovação, oposição até mesmo em relação à eliminação de certas coisas que se introduziram furtivamente na Igreja, por abuso ou fragilidade humana, como por exemplo:
O legalismo, o abstraccionismo, a pressão externa em problemas de consciência, graves abusos de autoridade nos conventos, assim como mudanças rebeldes na Fé católica, o que obviamente só pode representar o seu abandono.
Mas essas alternativas são falsas; porquanto existe realmente uma terceira opção, que acolhe bem as decisões oficiais do Concílio Vaticano e, ao mesmo tempo, rejeita enfaticamente as interpretações secularizantes que lhes são propostas pelos chamados teólogos e leigos 'progressistas'.
Esta terceira opção baseia-se, de facto, na inabalável Fé em Cristo e no Magistério infalível da Sua Santa Igreja.
Aceita como certo que não há lugar para alterações na Doutrina revelada por Cristo e divinamente interpretada e ensinada pela Igreja.
Não admite nenhuma possibilidade de mudança, excepto o “desenvolvimento” na formulação explícita do que já se achava presente na Fé dos Apóstolos, ou do que necessariamente daí decorre, como diz o Cardeal Newman.
Sustenta a atitude de que a Moralidade Cristã da Santidade, a Moralidade revelada na Sagrada Humanidade de Cristo e nos Seus Mandamentos, exemplificada em todos os Santos, permanece a mesma para sempre.
Sustenta que o objectivo da nossa existência é sermos transformados em Cristo, tornando-nos, por Ele e n´Ele, criaturas novas, segundo as palavras de S. Paulo: “É esta a Vontade de Deus, a vossa santificação”.
Esta posição assevera a diferença radical entre o Reino de Deus e o "saeculum".
Leva em conta a luta entre o Espírito de Cristo e o espírito de Satanás, através de todos os séculos passados e futuros, até ao fim do mundo.
Crê que as palavras de Cristo -- “Se fôsseis do mundo, o mundo vos amaria como seus; mas, como não sois do mundo, porque do mundo vos escolhi, o mundo vos odeia” -- são tão válidas como em qualquer época anterior.
É esta, pura e simplesmente, a posição católica, sem mais nenhuma interpretação, nem excepções.
Alegra-se com toda a mudança que amplia o "instaurare omnia in Christus", e leva a Luz de Cristo aos sectores da vida que positivamente foram adicionados.
É de facto um encorajamento específico, sobretudo dirigido aos católicos, no sentido de confrontar e identificar tudo com o Espírito e a Verdade de Cristo, no tempo e fora do tempo, apesar do espírito mundano da nossa época ou de qualquer época passada.
Esta renovação aprecia, com especial reverência, aqueles grandes dons dos séculos cristãos que nos precederam, que reflectem a sagrada atmosfera da Igreja, como por exemplo, o Canto Gregoriano e os admiráveis Hinos da Liturgia latina.
Sustenta que isso jamais deve deixar de desempenhar grande papel na nossa Liturgia, e que em nossos dias, como no passado, constitui relevante missão apostólica.
Acredita que as Confissões de Santo Agostinho, os escritos de S. Francisco de Assis, as obras místicas de Santa Teresa d´Ávila, assim como tantas outras de análogo esplendor, encerram mensagem vital para todos os períodos da História.
Representa uma atitude de profunda e filial devoção ao Santo Padre e de reverente amor à Igreja, em todos os seus aspectos, como sendo o autêntico "sentire cum Ecclesia".
Deve ficar bem claro que esta terceira resposta, perante a crise actual da Igreja, não é timidamente comprometedora, mas consistente e sem rodeios.
Não é saudosista, nem antecipa um futuro meramente terreno, pois está focalizada para a Eternidade.
Assim, está apta a viver plenamente no presente, pois somente experimentamos em plenitude um presente efectivo quando conseguimos libertar-nos da tensão do passado e do futuro, quando já não somos prisioneiros do frenético impulso para o momento a seguir.
À luz da Eternidade, cada momento da vida, individual ou comunitária, recebe o seu completo significado e objectivo.
Portanto, devemos fazer justiça à nossa era, mas somente considerando-a à luz do destino eterno do homem, à luz de Cristo.
A resposta, que acabamos de descrever, envolve sérios cuidados e apreensões, devido à actual invasão da vida da Igreja pelo secularismo, considerando a crise actual como a mais séria de toda a História da Igreja.
Se bem que este ideal cristão viva na firme esperança de que a Igreja sempre triunfará, pois o Senhor prometeu:
“E as portas do Inferno não prevalecerão contra ela”.
(HILDEBRAND, Dietrich Von
- in "Cavalo de Tróia na Cidade de Deus"
- Ed. Agir. 1970, capítulo I, p. 19-22)
fonte:nova evangelização católica