quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Ven. Pio XII : o sacrifício eucarístico consiste essencialmente na imolação incruenta da vítima divina, imolação que é misticamente manifestada pela separação das sagradas espécies e pela sua oblação feita ao Pai Eterno.

  A santa comunhão pertence à integridade do sacrifício, e à participação nele por meio da recepção do augusto sacramento; e enquanto é absolutamente necessária ao ministro sacrificador, aos fiéis é vivamente recomendável.

http://www.presbiteros.com.br/site/wp-content/uploads/2010/08/Papa-Pio-XII.jpg

CARTA ENCÍCLICA DO PAPA PIO XII
MEDIATOR DEI
SOBRE A SAGRADA LITURGIA


 
III. A comunhão eucarística
100. O augusto sacrifício do altar conclui-se com a comunhão do divino banquete. Mas, como todos sabem, para haver integridade do sacrifício, somente é exigido que o sacerdote se nutra do alimento celeste e não que o povo - coisa aliás sumamente desejável - participe da santa comunhão.

101. Agrada-nos a esse propósito repetir as considerações de Nosso predecessor Bento XIV sobre as definições do concílio de Trento: "Em primeiro lugar... devemos dizer que a nenhum fiel pode vir à mente que as missas privadas, nas quais apenas o sacerdote comunga, percam por isso o valor do verdadeiro, perfeito e íntegro sacrifício instituído por Cristo Senhor e devam, portanto, ser consideradas ilícitas. Nem os fiéis ignoram - pelo menos podem ser facilmente instruídos - que o sacrossanto concílio de Trento, fundando-se na doutrina guardada na ininterrupta tradição da Igreja, condenou a nova e falsa doutrina de Lutero, contraria a esta"(103). Quem disser que as missas nas quais só o sacerdote comunga sacramentalmente são ilícitas, e por isso devam ser abolidas, seja anátema".(104)

102. Afastam-se, pois, do caminho da verdade os que recusam celebrar, se o povo cristão não se aproximar da mesa divina; e ainda mais se afastam os que, para sustentar a absoluta necessidade de que os fiéis se nutram do banquete eucarístico juntamente com o sacerdote, afirmam capciosamente que não se trata somente de um sacrifício, mas de sacrifício e banquete de união fraterna, e fazem da santa comunhão em comum quase o ápice de toda a celebração.

103. Deve-se ainda uma vez notar que o sacrifício eucarístico consiste essencialmente na imolação incruenta da vítima divina, imolação que é misticamente manifestada pela separação das sagradas espécies e pela sua oblação feita ao Pai Eterno. A santa comunhão pertence à integridade do sacrifício, e à participação nele por meio da recepção do augusto sacramento; e enquanto é absolutamente necessária ao ministro sacrificador, aos fiéis é vivamente recomendável.

104. Como, porém, a Igreja, enquanto mestra de verdade, se esforça com todo o cuidado por guardar a integridade da fé católica, assim, enquanto mãe solícita de seus filhos exorta-os instantemente a participarem com avidez e freqüência deste máximo benefício da nossa religião.

105. Deseja antes de tudo, que os cristãos - especialmente quando não possam facilmente receber de fato o alimento eucarístico - o recebam ao menos em desejo; de sorte que se unam a ele com fé viva, com ânimo reverentemente humilde e confiante na vontade do Redentor divino e com o amor mais ardente.

106. Mas isso não lhe basta. Já que, como acima dissemos, podemos participar do sacrifício também pela comunhão sacramental, por meio do banquete do pão dos anjos, a madre Igreja, para que mais eficazmente "possamos sentir em nós continuamente o fruto da redenção" (105) repete a todos os seus filhos o convite de Cristo Senhor: "tomai e comei... fazei isto em minha memória".(106) Nesse propósito o concílio de Trento, fazendo eco aos desejos de Jesus Cristo e de sua esposa imaculada, insta por "que em todas as missas os fiéis presentes participem não só espiritualmente, mas ainda sacramentalmente da eucaristia, para que lhes venha mais abundante o fruto deste sacrifício".(107) Aliás, para melhor e mais claramente manifestar-se a participação dos fiéis no sacrifício divino por meio da comunhão eucarística, o nosso imortal predecessor Bento XIV louva a devoção daqueles que, não só desejam nutrir-se do alimento celeste durante a assistência ao sacrifício, mas preferem alimentar-se com hóstias consagradas no mesmo sacrifício, se bem que, como ele declara, participemos verdadeira e realmente do sacrifício, mesmo quando se trate de pão eucarístico devidamente consagrado antes. Assim, com efeito, escreve: "Embora participem do mesmo sacrifício não só aqueles aos quais o sacerdote celebrante dá parte da Vítima por ele oferecida na mesma missa, mas também aqueles aos quais o sacerdote dá a eucaristia que se costuma conservar; nem por isso a Igreja proibiu no passado, ou proíbe atualmente, que o sacerdote satisfaça à devoção e ao justo pedido daqueles que assistem à missa e pedem para participar do mesmo sacrifício, também por eles oferecido na maneira que lhes é apropriada; antes aprova e deseja que assim se faça e reprovaria os sacerdotes que, por sua culpa ou negligência privassem os fiéis desta participação". (108)

107. Queira, pois, Deus que todos, espontanea e livremente, correspondam a esses solícitos convites da Igreja; queira Deus que os fiéis, mesmo todos os dias se o puderem, participem não só espiritualmente do sacrifício divino, mas ainda da comunhão do augusto sacramento, recebendo o corpo de Jesus Cristo, oferecido por todos ao Pai Eterno. Estimulai, veneráveis irmãos, nas almas confïadas aos vossos cuidados, a apaixonada e insaciável fome de Jesus Cristo; vosso ensinamento cerque os altares de crianças e de jovens que ofereçam ao Redentor divino a sua inocência e o seu entusiasmo: aproximem-se freqüentemente os cônjuges para que, nutridos na sagrada mesa e graças a ela, possam educar no espírito e na caridade de Jesus Cristo a prole que lhes foi confiada; sejam convidados os operários para que possam receber o alimento eficaz e indefectível que lhes restaura as forças e prepara às suas fadigas a recompensa eterna no céu; aproximai enfim os homens de todas as classes e "compeli-os a entrar",(109) porque este é o pão da vida do qual todos têm necessidade. A Igreja de Jesus Cristo só dispõe desse pão para saciar as aspirações e os desejos das nossas almas, para uni-las intimamente a Jesus Cristo, afim de, por ele, se tornarem "um só corpo"(110) e confraternizarem quantos se sentam à mesma mesa para tomar o remédio da imortalidade (111) com a fração do pão único.

108. É assaz oportuno, ainda - o que aliás é estabelecido pela liturgia - que o povo compareça à santa comunhão depois que o sacerdote tomou no altar o alimento divino; e, como já dissemos, são para louvar aqueles que, assistindo à missa, recebem as hóstias consagradas no mesmo sacrifício, verificando-se destarte que "quantos, participando deste altar, hajamos recebido o sacrossanto corpo e sangue de teu Filho, sejamos cumulados de toda a graça e bênção celeste".(112)

109. Todavia, não faltam nem são raras as causas pelas quais se deva distribuir o pão eucarístico, antes ou depois do sacrifício, como também que se comungue com hóstias anteriormente consagradas, embora se distribua a comunhão em seguida à do sacerdote. Mesmo nesses casos - como aliás já advertimos antes - o povo participa regularmente do sacrifício eucarístico e pode freqüentemente, com maior facilidade, aproximar-se da mesa de vida eterna. Se a Igreja com maternal condescendência se esforça por vir ao encontro das necessidades espirituais dos seus filhos, estes, contudo, de sua parte, não devem facilmente desdenhar o que a sagrada liturgia aconselha e, sempre que não haja motivo plausível em contrário, devem fazer tudo o que mais claramente manifesta no altar a viva unidade do corpo místico.

110. Finda a sagrada ação, regulada pelas normas litúrgicas particulares, não dispensa a ação de graças de quem saboreou o alimento celeste; é, aliás muito conveniente que, recebido o alimento eucarístico e terminados os ritos públicos, se recolha e, intimamente unido com o divino Mestre, se entretenha com ele tanto quanto as circunstâncias lho permitam, em dulcíssimo e salutar colóquio. Afastam-se, pois, do reto caminho da verdade aqueles que, baseando-se nas palavras mais que no sentido, afirmam e ensinam que, terminada a missa, não se deve prolongar a ação de graças, não só porque o sacrifício do altar é por natureza uma ação de graças mas ainda porque isso pertence à piedade privada, pessoal e não ao bem da comunidade. Pelo contrário, a própria natureza do Sacramento requer do cristão que o recebe, que se locuplete com abundantes frutos de santidade.


111. Certamente a pública assembléia da comunidade está dissolvida, mas é necessário que os indivíduos unidos com Cristo não interrompam na sua alma o cântico de louvor, "agradecendo sempre tudo em nome de nosso Senhor Jesus Cristo a Deus e Pai".(113) A isso nos exorta ainda a própria liturgia do sacrifício eucarístico, quando nos manda rezar com estas palavras: "Concede, nós te pedimos, render-te contínuas graças (114) e não cessar jamais de louvar-te".(115) Se se deve, pois, sempre agradecer a Deus e jamais cessar de louvá-lo, quem ousaria repreender e desaprovar a Igreja que aconselha aos seus sacerdotes (116) e aos fiéis entreterem-se ao menos um pouco de tempo depois da comunhão em colóquio com o divino Redentor, e que inseriu nos livros litúrgicos oportunas orações enriquecidas de indulgências com as quais os sagrados ministros se possam convenientemente preparar antes de celebrar e de comungar e, acabada a santa missa, manifestar a Deus a sua ação de graças? A sagrada liturgia, longe de sufocar os íntimos sentimentos particulares dos cristãos, os facilita e estimula a que sejam assimilados a Jesus Cristo e por meio dele dirigidos ao Pai; portanto ela mesma exige que aquele que se aproxima da mesa eucarística agradeça devidamente a Deus. O divino Redentor compraz-se em ouvir as nossas orações, falar conosco de coração aberto e oferecer-nos refúgio no seu Coração ardente.

112. Esses atos próprios dos indivíduos são absolutamente necessários para aproveitar-nos mais abundantemente de todos os sobrenaturais tesouros de que é rica a eucaristia e para transmiti-los aos outros segundo as nossas possibilidades, a fim de que Cristo Senhor consiga em todas as almas a plenitude de sua virtude. Por que, pois, veneráveis irmãos; não louvaremos aqueles que, recebido o alimento eucarístico, ainda depois que se dissolveu oficialmente a assembléia cristã, se demoram em íntima familiaridade com o divino Redentor, não só para tratar docemente com ele, mas ainda para agradecê-lo, louvá-lo e especialmente para pedir-lhe ajuda, e, assim, afastar de sua alma tudo quanto possa diminuir a eficácia do sacramento, ao passo que se aproveita de tudo o que logra favorecer a atualíssima ação de Jesus? Antes, nós os exortamos a fazê-lo, de modo particular, quer traduzindo na prática os propósitos concebidos e exercitando as virtudes cristãs, quer adaptando às próprias necessidades quanto tenham recebido com real liberalidade. Falava deveras segundo os preceitos e espírito da liturgia o autor do áureo livrinho a "Imitação de Cristo", quando aconselhava a quem tivesse comungado: "Recolhe-te em segredo e goza de teu Deus para que possuas aquele que o mundo inteiro não poderá tirar-te".(117)

113. Assim, pois, intimamente unidos a Cristo, procuremos todos mergulhar em sua santíssima alma e unir-nos com ele para participar dos atos de adoração com os quais ele oferece à Trindade Augusta a homenagem mais grata e aceita; aos atos de louvor e de ação de graças que ele oferece ao Pai Eterno e a que faz eco o cântico do céu e da terra: "Bendigam ao Senhor todas as suas obras"; (118) participando dos atos, imploremos a ajuda celeste no momento mais oportuno para pedir e obter socorro em nome de Cristo (119) mas, sobretudo, ofereçamo-nos e imolemo-nos como vítimas clamando: "Faze que sejamos oferta eterna a ti",(120)

114. O divino Redentor repete incessantemente o seu insistente convite: "Permanecei em mim".(121) por meio do sacramento da eucaristia, Cristo fica em nós e nós ficamos em Cristo; e como Cristo, permanecendo em nós, vive e opera, assim é necessário que nós, permanecendo em Cristo, por ele vivamos e operemos.