Concluindo estas reflexões que apresento com simplicidade a vocês, permitam-me concluir com uma consideração que me parece de grande atualidade.
Refiro-me ao caráter sagrado da liturgia e do Sacerdócio católico. A Eucaristia e o Sacerdócio são santos porque são obra de Deus e não dos homens. São santos, portanto, por sua própria origem. Ambos nascem de Deus, por obra divina e a Ele são orientados. É missão e dever da Igreja defender esta santidade.
Se ao longo dos séculos elementos acidentais da celebração eucarística foram se transformando, nos ritos e nos costumes, existe no entanto algo de imutável. Refiro-me à "sacralidade" da Eucaristia, ou seja, à sua realidade de "ação sagrada". Santa e sagrada porque nela está presente e age o Cristo, "o santo de Deus". [01] Por esta razão afirma o Concílio Vaticano II: "Na santíssima Eucaristia está contido todo o tesouro espiritual da Igreja, isto é, o próprio Cristo, a nossa Páscoa e o Pão vivo que dá a vida aos homens mediante a sua carne vivificada e vivificadora pelo Espírito Santo; assim são eles convidados e levados a oferecer, juntamente com ele, a si mesmos, aos seus trabalhos e a todas as coisas criadas". [02]
Com efeito, é Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro Homem, que, representado pelo Sacerdote, entra no santuário para oferecer-se ao Pai e que anuncia o seu Evangelho. É Cristo aquele que oferece e é também Ele mesmo a oferta, o consagrante e o consagrado. A Eucaristia é ação santa por excelência, porque é ela que constitui as Sagradas Espécies, as "coisas santas dadas aos santos", como recitam algumas fórmulas litúrgicas do Oriente. É importante repetir com força que a "sacralidade" da Missa não é algo acrescentado pelos homens à ação de Cristo no Cenáculo, liturgia primária e constitutiva, com a qual o Senhor celebrou sacramentalmente, Ele mesmo como Sacerdote, o mistério da sua Paixão, Morte na cruz e Ressurreição, o seu Sacrifício redentor. A "sacralidade" da Missa é uma realidade instituída por Cristo.
O Sacerdote do Novo Testamento oferece o Santo Sacrifício "in persona Christi", o que quer dizer muito mais do que "em nome de", ou "fazendo as vezes de". "In persona" significa uma identificação específica, sacramental, com o Sumo e Eterno Sacerdote, que é o autor e sujeito principal do próprio Sacrifício, no qual Ele não pode ser substituído por ninguém. Ele, e somente Ele, o Cristo, poderia e pode ser realmente "propitiatio pro peccatis nostris ... sed etiam totius mundi". [03] Somente o Sacrifício de Cristo, e de ninguém mais, poderia possuir força propiciadora junto ao Pai, junto à sua transcendente santidade. A consciência desta realidade fundamental deve iluminar o caráter e o significado do padre-celebrante, que, realizando o Santo Sacrifício e agindo in persona Christi, é introduzido e inserido, de maneira sacramental, no âmbito desta "ação sagrada", na qual ele associa espiritualmente todos os participantes da assembleia eucarística.
Esta ação "sagrada", realizada em modalidades litúrgicas diversas, pode prescindir de elementos secundários, que aparecem e desaparecem no natural desenvolvimento dos ritos na história, mas não poderá jamais ser privada da sacralidade e da sacramentalidade essenciais, queridas por Cristo e transmitidas à Igreja, com a autoridade que vem do próprio Cristo. Este "sacrum" nunca poderá ser instrumentalizado para outros fins. Recordemo-nos, queridos Padres, que nenhum de nós é "dono" da Liturgia e, portanto, livres de adaptá-la a nossos gostos e fantasias. Lembremo-nos de que nenhum de nós deve aparecer como centro de atenção ou, o que é lamentável, fazer da celebração um palco para aparecermos. Somo "servos" dela, porque inseridos ontologicamente, por força do Sacramento recebido na nossa ordenação, no próprio mistério do Cristo, Sacerdote e Oferta. Evitemos, portanto, com zelo e amoroso cuidado, qualquer instrumentalização, qualquer particularismo, na celebração litúrgica. Celebremos com amor e devoção como a Igreja nos pede, seguindo fielmente o que ela estabeleceu, não por um mero ritualismo, mas porque imbuídos desta verdade: é Cristo que celebra em minha pessoa.
A Igreja tem o dever de garantir e de assegurar o "sacrum" da Eucaristia. Esta missão torna-se ainda mais urgente, quando se vive em uma cultura desacralizada, para não dizer neo-pagã. É de se desejar que a tomada de consciência dos problemas e dos muitos abusos litúrgicos que devem hoje ser enfrentados, possa encontrar modalidades concretas de realização, de maneira a garantir, além de uma correta celebração da Eucaristia, também uma nova vitalidade da fé católica acerca do Augusto Sacramento.
Os ministros da Eucaristia devemos estar convencidos desta verdade, deixar-nos transfigurar por uma fé eucarística autenticamente católica, viva e profunda. E à luz de tal fé, somos chamados a compreender e a viver o nosso ministério sacerdotal. A cada celebração eucarística, como também na nossa vida sacerdotal concreta, recordemo-nos da admoestação pronunciada pelo Bispo no momento da nossa ordenação: "Toma consciência do que fazes e põe em prática o que celebras". [04]
[02] Conc. Ecum. Vat. II., decr. Presbyterorum Ordinis, n. 5.
[03] 1 Jo 2,2; cf. 1Jo 4,10.
[04] Ritual da Ordenação de Bispos, Presbíteros e Diáconos, Ordenação da Presbíteros, n. 135; Paulus, São Paulo 2002, p. 70.
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