Henrique Morgantini Próximo de completar 79 anos, o Bispo Emérito de Anápolis, Dom Manoel Pestana Filho, representa hoje um dos mais importantes nomes da Igreja Católica em Goiás. Nessa entrevista, o sacerdote explica o que tem feito desde que deixou o comando da Diocese. "Continuo dando aula no seminário, no curso de Filosofia e atendo três capelas da periferia". Dom Manoel conta de maneira simples e cativante a sua trajetória de vida, desde a infância em Santos (SP) até o momento que decidiu ir para o seminário e os primeiros meses em Anápolis. "Eu cheguei aqui praticamente de pára-quedas. Fiquei sabendo pouco tempo antes de vir que o Papa me havia designado para Anápolis", diz. Ele lembra que no início trabalhou bastante para a formação de novos religiosos. "Foi uma experiência dura", recorda. Dom Manoel fala sobre fé, explica a campanha da fraternidade desse ano que defende a Amazônia e analisa a importância da vinda do Papa Bento XVI ao Brasil e a canonização de Frei Galvão. "A canonização mostra que a santidade, a perfeição da vida cristã, não é algo impossível". Sobre o Papa, ele completa: "A vinda do Papa pode ajudar muito a própria Igreja superar problemas que está tendo agora". A seguir confira os melhores trechos da entrevista. O senhor se ‘aposentou’ em 2004, mas continua trabalhando? Estou aposentado sob certo aspecto porque eu continuo dando aula no seminário, no curso de Filosofia e atendo três capelas da periferia, naquela área do Daia e proximidade. E faço outras coisas ainda, eu escrevo e atendo às pessoas que me procuram. O senhor nasceu em Santos, mas está aqui há 27 anos. Nesse tempo todo, quais as mudanças que o senhor viu a cidade passar do ponto de vista da Igreja Católica? Olha, na verdade eu cheguei aqui praticamente de pára-quedas. Fiquei sabendo pouco tempo antes de vir que o Papa me havia designado para Anápolis. Eu tinha passado uma vez aqui, em 1970, quando do Congresso Eucarístico de Brasília. Eu não tinha muita idéia. Vi apenas, naquela noite, algumas luzes. Mas, eu logo que soube da nomeação fui procurar as fontes que eu tinha à disposição, era inclusive aquela enciclopédia dos municípios, para ver onde era Anápolis, o que era Anápolis e todos os municípios pequenos que giravam em torno da cidade do ponto de vista eclesiástico. Depois eu vim pra cá. Fui recebido de uma maneira muito cordial, muito simpática, e começamos então a luta. E foi uma luta mesmo desde o começo. Agora a preocupação mais imediata que eu tive foi com o clero porque nós tínhamos apenas nove sacerdotes diocesanos, ligados diretamente ao bispo. E era muito pouco porque se falava em 550 mil habitantes em toda a região. Eu pensei, podem me chamar de general, mas general sem soldados. O que eu vou fazer aqui? Assim começamos o seminário, em 1980. Foi uma aventura, começando na casa do bispo mesmo. Cada apartamento que havia lá foi preenchido por cinco estudantes que vieram de vários lugares, principalmente norte e nordeste. Havia apenas um rapaz que morava aqui, mas era oriundo de Minas Gerais. Foi uma experiência dura porque recebemos até candidatos que haviam terminado o colegial e começamos. Desses aí que iniciaram uns 20 estão hoje trabalhando no norte e nordeste. Fizeram apenas a filosofia. Aos poucos foram chegando outros aqui da região. Hoje nós temos mais de 40 sacerdotes que começaram aqui e são daqui. O senhor está contando uma história que é de luta. A igreja tem essa função de ocupar brechas, espaços que a sociedade está em falta? Claro que tem. Nós não evangelizamos o homem abstrato, nós evangelizamos o homem concreto. E antes de eu pregar para um filho que está morrendo de fome eu preciso arranjar um prato de comida para ele. A mesma coisa se trata em relação à dignidade humana porque um homem que perde o respeito por si mesmo não se interessa por coisa nenhuma. Então as coisas não foram fáceis. Em Santos o clima era mais agitado. Era aquele tempo das grandes greves no porto que significaram um alarde para o Brasil todo. Fale um pouco mais sobre sua vida. Existiu um momento quando o senhor foi chamado para seguir esse caminho na Igreja? A nossa família era pobre. Papai trabalhava no porto de Santos, nas docas. Meu avô era da estiva e sempre esteve no sindicato da categoria, desde a sua fundação. Nós não passávamos fome, mas era uma vida bastante sacrificada. E éramos muito religiosos, íamos sempre à missa, sempre tivemos uma fé muito grande. Eu participava, mas nunca me interessei por vocação. Tanto é que nunca fui coroinha. Fui uma criança que comungou aos seis anos e meio de idade. E um dia eu estava em uma escola pública e a professora chegou, olhou para mim, e disse ‘eu vi o Pestana rezando hoje na Igreja de São José, esse menino vai acabar padre ou frade’. E eu dei um berro, falei ‘não!’. Aí todo mundo começou a rir. Engraçado... Essa foi uma coisa estranha. Porque mais tarde, quando eu já era sacerdote, tinha voltado de Roma onde havia estudado teologia, lá em Santos eu estava com um diretor da faculdade de filosofia e o vigário da paróquia me chamou para celebrar uma missa. Eu fui lá e era a missa de sétimo dia da minha professora. Eu parei bastante chocado e disse ‘olha, foi ela mesma que me chamou’. Mas com nove anos de idade alguns padres missionários me quiseram levar para o seminário. Mamãe e papai não deixaram. Quer dizer, não foi estimulo da minha casa. Papai achava que eu era criança demais para poder pensar em uma coisa dessas. Em uma decisão séria como essa? Isso. Aos 12 anos um vigário voltou a lembrar. Ele disse ‘você vai ou não vai?’. Eu pedi que ele falasse com mamãe porque ela não tinha deixado alguns anos atrás. Dessa maneira entrei no seminário de Pirapora. Fui educado durante seis anos por padres holandeses e belgas e alguns brasileiros. Mas era uma formação muito séria. Quando se vai hoje ao que restou dos grandes seminários de Pirapora ficamos impressionados com o que restou. Da biblioteca, por exemplo. Os museus ou então os laboratórios. Tínhamos laboratório de química e de física. Não era brincadeira. E não fazíamos outra coisa a não ser rezar, estudar e jogar futebol ou vôlei. Durante a sua formação o senhor passou por momentos de crise? No começo eu tive problemas não só por causa da objeção dos meus pais, mas porque eu tinha sonhos como qualquer criança. Eu gostava de matemática e imaginei ser algum dia engenheiro ou algo parecido. De repente larguei tudo isso. Estudei matemática, lógico, fui até professor de álgebra mais tarde. Eu era o primeiro de dez irmãos; três já haviam morrido. Então eu via a vida que meus irmãos levavam e dizem que padre não entende família porque é celibatário. Isso não tem sentido porque eu não nasci de um ovo chocado no deserto. Então minha vida foi normal, de uma família normal. Mas eu tinha que escolher. Eu tinha o pé no chão e, apesar de criança, eu queria. E o que me ajudou muito foi o auxílio de um padre que era o consultor espiritual para a gente. Nós conversamos uma vez por mês e ele acompanhava a nossa evolução. Lembro que uma vez sofri uma decepção muito grande. Achava que todos eram irmãos, mas depois a gente encontra lá [no seminário] um monte de moleques bem diferentes. Eu então fui chorando, tinha 13 anos, e disse que iria embora. Eu queria passar para outro seminário. Então ele me ouviu e disse ‘você pode ir, mas você tem que pensar, você nunca se perdoará por ter sido covarde’. Aí eu parei e depois saí de lá chorando, inclusive. Encontrei o reitor e ele me confortou. Isso foi uma crise de choque de cultura e de educação. Depois mais tarde, ao estudar a filosofia, tive uma crise de fé. Estudei muito. Tinha uns 17 anos. E eu me lembro que o que me ajudou muito foi descobrir diferentes aspectos do cristianismo. O questionamento da fé é fundamental para reafirmar a certeza na crença? Eu não tenho dúvidas. Caso a gente não tenha uma crise existencial não teremos uma segurança para reafirmar a decisão. Não é que não vai haver depois problemas. Quando se monta um prédio ele passa por uma fase de reajustes. Ou seja, a intensidade do vento, um movimento qualquer. E é isso que acontece. E se não tiver consistência ele cai. Eu não acredito muito em uma vocação que não passou por uma crise existencial. Qual a importância da campanha fraternidade e por que a Igreja escolheu esse tema de defesa da Amazônia? Na Bíblia quando se fala na criação do mundo Deus fala que é preciso trabalhar a terra e submetê-la. Quer dizer, Deus entrega ao homem a natureza para que ele a administre. É claro que há um código, que é o fundamento de toda a moral. Mas na verdade a função do homem é colocar a terra a seu serviço. Mas não a serviço de suas paixões e loucuras. Bem, isso já é algo interessante, o que está acontecendo hoje com a Nova Era. Tenta-se resolver o problema da ecologia simplesmente divinizando a matéria. Houve um grupo religioso nos EUA que na perspectiva do terceiro milênio eles estavam convencidos que o homem é o grande inimigo da natureza e, portanto, o que ele melhor pode fazer é se matar. E eles proclamaram que essa era a contribuição religiosa deles. Eles falavam em mãe terra, uma divindade que eles adoravam. O cristianismo deu a terra para serviço do homem. Isso que é matéria geral está nos agoniando. O Amazonas está sendo destruído. Qual a relação da Igreja em Anápolis com a política? De um modo geral a Igreja tem sempre restrições. Não a política enquanto política, mas a política enquanto uma realidade atual. Um ex-ministro da Educação da França dizia que a política sempre tem algo satânico. E todo poder corrompe. Então é um grande perigo e a dificuldade é ter gente que governa sem se aproveitar do cargo. Ou então que seja capaz de governar sem governar. Como diria Cícero, em favor de suas coisas. Essa é a grande desgraça de hoje. Eu me lembro da história de um ex-assessor do presidente Kennedy que foi para uma missão e depois ligou dizendo ‘chama-me de volta, pois estou chegando ao meu preço’. Quer dizer que temos que ter a consciência que somos fracos. Eu acho que falta muitas vezes não apenas homens competentes, mas honestos. A vinda do Papa Bento XVI ao Brasil e a canonização do Frei Galvão dará um novo impulso para a Igreja no País? A canonização mostra que a santidade, a perfeição da vida cristã, não é algo impossível. No caso o Frei Galvão representa alguém que sempre defendeu o povo. A santidade tem uma força incrível dentro da Igreja porque aparece em todas as idades e povos. Criança pode ser santo, por exemplo. Isso mostra que o cristianismo apesar de exigir heroísmo, ele é sempre possível. A vinda do Papa pode ajudar muito a própria Igreja superar problemas que está tendo agora. Quais problemas? Tínhamos muitos problemas doutrinários. E a gente não pode achar que esse tipo de erro seja apenas um erro de inteligência. A idéia não é uma coisa abstrata. Ela atua. Então, quando não se tem uma doutrina correta a coisa começa a degringolar. E sabemos que primeiro o homem perde a moral e depois ele perde a fé. O Papa vem então para corrigir rumos? DE:http://www.jornalestadodegoias.com.br/noticias_detalhe.php?id_noticia=497&&id_editoria=4 | |
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- E senti o espírito inundado por um mistério de luz que é Deus e N´Ele vi e ouvi -A ponta da lança como chama que se desprende, toca o eixo da terra, – Ela estremece: montanhas, cidades, vilas e aldeias com os seus moradores são sepultados. - O mar, os rios e as nuvens saem dos seus limites, transbordam, inundam e arrastam consigo num redemoinho, moradias e gente em número que não se pode contar , é a purificação do mundo pelo pecado em que se mergulha. - O ódio, a ambição provocam a guerra destruidora! - Depois senti no palpitar acelerado do coração e no meu espírito o eco duma voz suave que dizia: – No tempo, uma só Fé, um só Batismo, uma só Igreja, Santa, Católica, Apostólica: - Na eternidade, o Céu! (escreve a irmã Lúcia a 3 de janeiro de 1944, em "O Meu Caminho," I, p. 158 – 160 – Carmelo de Coimbra)