(4/10/2010) “Ai de mim, se não anunciar o Evangelho!”: a exclamação do Apóstolo Paulo foi evocada por Bento XVI ao receber nesta segunda-feira no Vaticano mais um grupo de Bispos brasileiros, dezoito, da região interior da Amazónia, uma extensíssima área de mais de dois milhões de Km2. O Santo Padre insistiu sobre a responsabilidade de dar cumprimento ao mandato de Jesus que nos mandou anunciar a sua Boa Nova.
Foi porque “Deus quer que todos os homens se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade” que Jesus veio a revelar-nos, por palavras e pela sua vida, os caminhos ordinários de salvação. É verdade que os homens se podem salvar por outras vias, graças à misericórdia de Deus, se eu não lhes anunciar o Evangelho. Mas – objectou o Papa – “poderei eu salvar-me se por negligência, medo, vergonha ou por seguir ideias falsas, deixar de o anunciar?”
Ponderando também a objecção que por vezes surge de que “impor uma verdade… ou uma via, ainda que seja a salvação” constituiria uma violência à liberdade religiosa, Bento XVI respondeu citando textualmente uma passagem da Exortação “Evangelii nuntiandi”, de Paulo VI:
“É claro que seria certamente um erro impor qualquer coisa à consciência dos nossos irmãos. Mas propor a essa consciência a verdade evangélica e a salvação em Jesus Cristo, com absoluta clareza e com todo o respeito pelas opções livres que essa consciência fará – e isso, sem pressões coercitivas, sem persuasões desonestas e sem aliciá-la com estímulos menos retos – longe de ser um atentado à liberdade religiosa, é uma homenagem a essa liberdade, à qual é proporcionado o escolher uma via que mesmo os não crentes reputam nobre e exaltante. (…) Esta maneira respeitosa de propor Cristo e o seu Reino, mais do que um direito, é um dever do evangelizador. E é também um direito dos homens seus irmãos receber dele o anúncio da Boa Nova da salvação”
No que diz respeito ao caso concreto do Brasil, e aos desafios com que ali se depara a renovação missionária, Bento XVI propôs o exemplo do jesuíta do século XVI José Anchieta:
“(…) vem-me a mente a figura do Beato José de Anchieta. Com efeito a sua incansável e generosíssima actividade apostólica, não isenta de graves perigos, que fez com que a Palavra de Deus se propagasse tanto entre os índios quanto entre os portugueses – razão pela qual desde o momento de sua morte recebeu o epíteto de Apóstolo do Brasil – pode servir de modelo para ajudar as vossas Igrejas particulares a encontrar os caminhos para empreender a formação dos discípulos missionários no espírito da Conferência de Aparecida”.
Neste contexto, o Papa advertiu contra o risco de “uma visão reducionista do conceito de missão”:
“Esta não pode ser limitada a uma simples busca de novas técnicas e formas que tornem a Igreja mais atrativa e capaz de vencer a concorrência com outros grupos religiosos ou com ideologias relativistas. A Igreja não trabalha para si: está ao serviço de Jesus Cristo; existe para fazer que a Boa Nova seja acessível para todas as pessoas. A Igreja é católica justamente porque convida todo o ser humano a experimentar a nova existência em Cristo”.
No início da audiência tomara a palavra, para uma saudação ao Papa, em nome dos 18 bispos presentes, todos da região da Amazónia interior, D. Moacyr Grechi, arcebispo de Porto Velho, que sublinhou como só a partir do Concílio Vaticano II a sociedade brasileira e a própria Igreja despertar para a realidade da Amazónia e para a atenção que merecia na actividade pastoral:
“A Amazônia sempre tem sido considerada colônia do resto do Brasil. Seus problemas surgem, quase todos, de fora. Também a Igreja do Brasil só acordou para a realidade da Amazônia como parte de sua estrutura e missão há poucas décadas. As etapas principais dessa mudança foram o Concílio Vaticano II, Medellín e a reunião dos bispos da região em Santarém-PA, com suas orientações e prioridades, em 1972. Este encontro é como que a carta de identidade da Igreja da Amazônia.
O Projeto “Igrejas Irmãs”, a vinda dos padres “fidei donum” (padres diocesanos mandados por suas Igrejas de origem) e a Comissão Episcopal para a Amazônia, foram decisivos para uma profunda mudança de atitude principalmente das dioceses do Sudeste e Sul do Brasil, em relação à sua responsabilidade quanto à Amazônia.
A pobreza, o reduzido número de padres, a invasão das Igrejas Pentecostais de todo gênero, são um desafio, sem contar os de natureza sócio-econômica e cultural. Só agora temos um modesto Instituto Superior na Amazônia aprovado oficialmente. Se hoje a Missão na Amazônia é difícil, o era infinitamente mais no tempo de nossos predecessores vindos de tantos países, e que prepararam o terreno para o nosso trabalho atual. Muitos deles e delas (Irmãs), seriam dignos/as da glória dos altares. Em nome de todo o episcopado da Amazônia quero agradecer a ajuda econômica que Sua Santidade, pessoalmente, se empenhou em nos oferecer nestes últimos anos."