MISSA NO SANTUÁRIO DE NOSSA SENHORA DO
ROSÁRIO
HOMILIA DO PAPA JOÃO PAULO
II
Fátima, 13 de Maio de 1982
1. “E a partir daquele momento, o discípulo recebeu-A em sua casa”
(Io. 19, 27)
Com estas palavras termina o Evangelho da Liturgia de hoje, aqui
em Fátima. O nome do discípulo era João. Precisamente ele, João, filho de
Zebedeu, apóstolo e evangelista, ouviu do alto da Cruz as palavras de Cristo:
“Eis a tua Mãe”. Anteriormente, Jesus tinha dito à própria Mãe: “Senhora, eis o
Teu filho”.
Este foi um testamento maravilhoso.
Ao deixar este mundo, Cristo deu a Sua Mãe um homem que fosse para
Ela como um filho: João. A Ela o confiou. E, em consequência desta doação e
deste acto de entrega, Maria tornou-se mãe de João. A Mãe de Deus tornou-se
Mãe do homem.
E, a partir daquele momento, João “recebeu-A em sua casa”. João
tornou-se também amparo terreno da Mãe de seu Mestre; é direito e dever dos
filhos, efectivamente, assumir o cuidado da mãe. Mas acima de tudo, João
tornou-se por vontade de Cristo o filho da Mãe de Deus. E, em João,
todos e cada um dos homens d’Ela se tornaram filhos.
2. “Recebeu-A em sua casa” – esta frase significa, literalmente,
na sua habitação.
Uma manifestação particular da maternidade de Maria em relação aos
homens são os lugares, em que Ela se encontra com eles; as casas onde Ela
habita; casas onde se sente uma presença toda particular da Mãe.
Estes lugares e estas casas são numerosíssimos. E são de uma
grande variedade: desde os oratórios nas habitações e dos nichos ao longo das
estradas, onde sobressai luminosa a imagem da Santa Mãe de Deus, até às capelas
e às igrejas construídas em Sua honra. Há porém, alguns lugares, nos quais os
homens sentem particularmente viva a presença da Mãe. Não raro, estes
locais irradiam amplamente a sua luz e atraem a si a gente de longe. O seu
círculo de irradiação pode estender-se ao âmbito de uma diocese, a uma nação
inteira, por vezes a vários países e até aos diversos continentes. Estes lugares
são os santuários marianos.
Em todos estes lugares realiza-se de maneira admirável aquele
testamento singular do Senhor Crucificado: aí, o homem sente-se entregue e
confiado a Maria e vem para estar com Ela, como se está com a própria Mãe.
Abre-Lhe o seu coração e fala-Lhe de tudo: “recebe-A em sua casa”, dentro de
todos os seus problemas, por vezes difíceis. Problemas próprios e de outrem.
Problemas das famílias, das sociedades, das nações, da humanidade inteira.
3. Não sucede assim, porventura, no santuário de Lourdes na
França? Não é igualmente assim, em Jasna Góra em terras polacas, no
santuário do meu País, que este ano celebra o seu jubileu dos seiscentos anos?
Parece que também lá, como em tantos outros santuários marianos
espalhados pelo mundo, com uma força de autenticidade particular, ressoam estas
palavras da Liturgia do dia de hoje:
“Tu és a honra do nosso povo” (Iudit. 15,10); e também aquelas outras: “Perante a humilhação da nossa gente”, “... aliviaste o nosso abatimento, com a tua rectidão, na presença do nosso Deus”(Iudt. 13,20).
Estas palavras ressoam aqui em Fátima quase como eco particular
das experiências vividas não só pela Nação portuguesa, mas também por
tantas outras nações e povos que se encontram sobre a face da terra; ou melhor,
elas são o eco das experiências de toda a humanidade contemporânea, de
toda a família humana.
4. Venho hoje aqui, porque exactamente neste mesmo dia do mês, no
ano passado, se dava, na Praça de São Pedro, em Roma, o atentado à vida do Papa,
que misteriosamente coincidia com o aniversário da primeira aparição em Fátima,
a qual se verificou a 13 de Maio de 1917.
Estas datas encontraram-se entre si de tal maneira, que me pareceu
reconhecer nisso um chamamento especial para vir aqui. E eis que hoje aqui
estou. Vim para agradecer à Divina Providência, neste lugar, que a Mãe de Deus
parece ter escolhido de modo tão particular.
“Misericordiae Domini, quia non sumus consumpti” – Foi graças ao
Senhor que não fomos aniquilados (Lam. 3, 22) – repito uma vez mais com o
Profeta.
Vim, efectivamente, sobretudo para aqui proclamar a glória do
mesmo Deus:
“Bendito seja o Senhor Deus, Criador do Céu e da Terra”, quero repetir com as palavras da Liturgia de hoje (Iudt. 13,18).
E ao Criador do Céu e da Terra elevo também aquele especial hino
de glória, que é Ela própria: a Mãe Imaculada do Verbo Encarnado:
“Abençoada sejas, minha filha, pelo Deus Altíssimo / Mais do que
todas as mulheres sobre a Terra... / A confiança que tiveste não será esquecida
pelos homens, / E eles hão-de recordar sempre o poder de Deus. / Assim Deus te
enalteça eternamente” (Ibid. 13, 18-20).
Na base deste canto de louvor, que a Igreja entoa com
alegria, aqui como em tantos lugares da terra, está a incomparável escolha de
uma filha do género humano para ser Mãe de Deus.
E por isso seja sobretudo adorado Deus: Pai, Filho, e Espírito Santo.
Seja bendita e venerada Maria, protótipo da Igreja, enquanto
“habitação da Santíssima Trindade”.
5. A partir daquele momento em que Jesus, ao morrer na Cruz, disse
a João: “Eis a tua Mãe”, e a partir do momento em que o discípulo “A recebeu em
sua casa”, o mistério da maternidade espiritual de Maria teve a sua
realização na história com uma amplidão sem limites. Maternidade quer dizer
solicitude pela vida do filho. Ora se Maria é mãe de todos os homens, o seu
desvelo pela vida do homem reveste-se de um alcance universal. A
dedicação de qualquer mãe abrange o homem todo. A maternidade de Maria tem o seu
início nos cuidados maternos para com Cristo.
Em Cristo, aos pés da Cruz, Ela aceitou João e, nele, aceitou
todos os homens e o homem totalmente. Maria a todos abraça, com uma
solicitude particular, no Espírito Santo. É Ele, efectivamente, “Aquele que dá a
vida”, como professamos no Credo. É Ele que dá a plenitude da vida, com abertura
para a eternidade.
A maternidade espiritual de Maria é, pois, participação no
poder do Espírito Santo, no poder d’Aquele “que dá a vida”. E é ao mesmo
tempo, o serviço humilde d’Aquela que diz de si mesma: “Eis a serva do Senhor”
(Luc. 1, 38).
À luz do mistério da maternidade espiritual de Maria, procuremos
entender a extraordinária mensagem que, daqui de Fátima, começou a ressoar pelo
mundo todo, desde o dia 13 de Maio de 1917, e que se prolongou durante cinco
meses, até ao dia 13 de Outubro do mesmo ano.
6. A Igreja ensinou sempre, e continua a proclamar, que a
revelação de Deus foi levada à consumação em Jesus Cristo, que é a plenitude da
mesma, e que “não se há-de esperar nenhuma outra revelação pública, antes da
gloriosa manifestação de nosso Senhor Jesus Cristo” (Dei
Verbum, 4). A mesma Igreja aprecia e julga as revelações privadas
segundo o critério da sua conformidade com aquela única Revelação pública.
Assim, se a Igreja aceitou a mensagem de Fátima, é sobretudo
porque esta mensagem contém uma verdade e um chamamento que, no
seu conteúdo fundamental, são a verdade e o chamamento do próprio
Evangelho.
“Convertei-vos (fazei penitência), e acreditai na Boa Nova
(Mc. 1, 15): são estas as primeiras palavras do Messias dirigidas à
humanidade. E a mensagem de Fátima, no seu núcleo fundamental, é o chamamento
à conversão e à penitência, como no Evangelho. Este chamamento foi feito
nos inícios do século vinte e, portanto, foi dirigido, de um modo particular a
este mesmo século. A Senhora da mensagem parecia ler, com uma perspicácia
especial, os “sinais dos tempos”, os sinais do nosso tempo.
O apelo à penitência é um apelo maternal; e, ao mesmo tempo, é
enérgico e feito com decisão. A caridade que “se congratula com a
verdade”(1Cor 13, 6) sabe ser clara e firme. O chamamento à penitência,
como sempre anda unido ao chamamento à oração. Em conformidade com a
tradição de muitos séculos, a Senhora da mensagem de Fátima indica o
terço – o rosário – que bem se pode definir “a oração de Maria”: a
oração na qual Ela se sente particularmente unida connosco. Ela própria reza
connosco. Com esta oração do terço se abrangem os problemas da Igreja, da Sé de
Pedro, os problemas do mundo inteiro. Além disto, recordam-se os pecadores, para
que se convertam e se salvem, e as almas do Purgatório.
As palavras de mensagem foram dirigidas a crianças, cuja idade ia
dos sete aos dez anos. As crianças, como Bernadette de Lourdes, são
particularmente privilegiadas nestas aparições da Mãe de Deus. Daqui deriva o
facto de também a sua linguagem ser simples, de acordo com a capacidade de
compreenção infantil. As criancinhas de Fátima tornaram-se as interlocutoras
da Senhora da mensagem e também as suas colaboradoras. Uma delas ainda está
viva.
7. Quando Jesus disse do alto da Cruz: “Senhora, eis o Seu filho”
(Io. 19, 26), abriu, de maneira nova, o Coração da Sua Mãe,
o coração Imaculado, e revelou-Lhe a nova dimensão do amor e o novo alcance do
amor a que Ela fora chamada, no Espírito Santo, em virtude do sacrifício da
Cruz.
Nas palavras da mensagem de Fátima parece-nos encontrar
precisamente esta dimensão do amor materno, o qual com a sua amplitude,
abrange todos os caminhos do homem em direcção a Deus: tanto aqueles que seguem
sobre a terra, como aqueles que, através do Purgatório, levam para além da
terra. A solicitude da Mãe do Salvador, identifica-se com a solicitude pela
obra da salvação: a obra do Seu Filho. É solicitude pela salvação, pela
eterna salvação de todos os homens. Ao completarem-se sessenta e cinco anos,
depois daquele dia 13 de Maio de 1917 é difícil não descobrir como este amor
salvífico da Mãe abraça na sua amplitude, de um modo particular, o nosso
século.
À luz do amor materno, nós compreendemos toda a mensagem de Nossa
Senhora de Fátima.
Aquilo que se opõe mais directamente à caminhada do homem em
direcção a Deus é o pecado, o perseverar no pecado, enfim, a negação de Deus. O
programado cancelamento de Deus do mundo do pensamento humano. A
separação d’Ele de toda a actividade terrena do homem. A rejeição de
Deus por parte do homem.
Na verdade, a salvação eterna do homem somente em Deus se
encontra. A rejeição de Deus por parte do homem se se tornar definitiva,
logicamente conduz à rejeição do homem por parte de Deus (Cfr. Matth. 7,
23; 10, 33), à condenação.
Poderá a Mãe, que deseja a salvação de todos os homens, com toda a
força do seu amor que alimenta no Espírito Santo, poderá Ela ficar calada acerca
daquilo que mina as próprias bases desta salvação? Não, não pode!
Por isso, a mensagem de Nossa Senhora de Fátima, tão maternal, se
apresenta ao mesmo tempo tão forte e decidida. Até parece severa. É como se
falasse João Baptista nas margens do rio Jordão. Exorta à penitencia.
Adverte. Chama à oração. Recomenda o terço, o rosário.
Esta mensagem é dirigida a todos os homens. O amor da Mãe do
Salvador chega até onde quer que se estenda a obra da salvação. E objecto do Seu
desvelo são todos os homens da nossa época e, ao mesmo tempo, as
sociedades, as nações e os povos. As sociedades ameaçadas pela apostasia,
ameaçadas pela degradação moral. A derrocada da moralidade traz consigo a
derrocada das sociedades.
8. Cristo disse do alto da Cruz: “Senhora, eis o Teu filho”. E,
com tais palavras, abriu, de um modo novo, o Coração da Sua Mãe.
Pouco depois, a lança do soldado romano trespassou o lado do
Crucificado. Aquele coração trespassado tornou-se o sinal da redenção, realizada
mediante a morte do Cordeiro de Deus.
O Coração Imaculado de Maria aberto pelas palavras – “Senhora, eis
o Teu Filho” – encontra-se espiritualmente com o Coração do Filho trespassado
pela lança do soldado. O Coração de Maria foi aberto pelo mesmo amor para com
o homem e para com o mundo com que Cristo amou o homem e o mundo,
oferecendo-Se a Si mesmo por eles, sobre a Cruz, até àquele golpe da lança do
soldado.
Consagrar o mundo ao Coração Imaculado de Maria significa
aproximar-nos, mediante a intercessão da Mãe, da própria Fonte da Vida, nascida
no Gólgota. Este Manancial escorre ininterruptamente, dele brotando a
redenção e a graça. Nele se realiza continuamente a reparação pelos pecados do
mundo. Tal Manancial é sem cessar Fonte de vida nova e de santidade.
Consagrar o mundo ao Imaculado Coração da Mãe significa voltar de
novo junto da Cruz do Filho. Mais quer dizer, ainda: consagrar este mundo
ao Coração trespassado do Salvador, reconduzindo-o à própria fonte da Redenção.
A Redenção é sempre maior do que o pecado do homem e do que “o pecado do mundo”.
A força da Redenção supera infinitamente toda a espécie de mal, que está no
homem e no mundo.
O Coração da Mãe está conscio disso, como nenhum outro
coração em todo o cosmos, visível e invisível.
E para isso faz a chamada.
Chama não somente à conversão. Chama-nos a que nos deixemos
auxiliar por Ela, como Mãe, para voltarmos novamente à fonte da Redenção.
9. Consagrar-se a Maria Santíssima significa recorrer ao seu
auxílio e oferecermo-nos a nós mesmos e oferecer a humanidade Àquele que é
Santo, infinitamente Santo; valer-se do seu auxílio – recorrendo ao seu Coração
de Mãe aberto junto da Cruz ao amor para com todos os homens e para com o mundo
inteiro – para oferecer o mundo, e o homem, e a humanidade, e todas as nações
Àquele que é infinitamente Santo. A santidade de Deus manifestou-se na redenção
do homem, do mundo, da inteira humanidade e das nações: redenção esta que se
realizou mediante o sacrifício da Cruz. “Por eles, Eu consagro-me a Mim
mesmo”, tinha dito Jesus” (Io. 17, 19).
O mundo e o homem foram consagrados com a potência da
Redenção. Foram confiados Àquele que é infinitamente Santo. Foram oferecidos
e entregues ao próprio Amor, ao Amor misericordioso.
A Mãe de Cristo chama-nos e exorta-nos a unir-nos à Igreja do Deus
vivo, nesta consagração do mundo, neste acto de entrega mediante o qual o
mesmo mundo, a humanidade, as nações e todos e cada um dos homens são oferecidos
ao Eterno Pai, envoltos com a virtude da Redenção de Cristo. São oferecidos no
Coração do Redentor trespassado na Cruz.
A Mãe do Redentor chama-nos, convida-nos e ajuda-nos para nos
unirmos a esta consagração, a este acto de entrega do mundo. Então
encontrar-nos-emos, de facto, o mais próximo possível do Coração de Cristo
trespassado na Cruz.
10. O conteúdo do apelo de Nossa Senhora de Fátima está tão
profundamente radicado no Evangelho e em toda a Tradição, que a Igreja se
sente interpelada por essa mensagem.
Ela respondeu à interpelação mediante o Servo de Deus Pio XII
(cuja ordenação episcopal se realizara precisamente a 13 de Maio de 1917), o
qual quis consagrar ao Imaculado Coração de Maria o género humano e
especialmente os Povos da Rússia. Com essa consagração não terá ele, porventura,
correspondido à eloquência evangélica do apelo de Fátima?
O Concílio Vaticano II, na Constituição dogmática sobre a Igreja
“Lumen
Gentium” e na Constituição pastoral sobre a Igreja no Mundo
Contemporâneo “Gaudium
et Spes” explicou amplamente as razões dos laços que unem a Igreja com o
mundo de hoje. Ao mesmo tempo os seus ensinamentos sobre a presença especial de
Maria no mistério de Cristo e da Igreja, maturaram no acto com que Paulo VI, ao
chamar a Maria também Mãe da Igreja, indicava de maneira mais profunda o
carácter da sua união com a mesma Igreja e da Sua solicitude pelo mundo, pela
humanidade, por cada um dos homens e por todas as nações: a sua maternidade.
Deste modo, foi ainda mais aprofundada a compreensão do sentido
da entrega, que a Igreja é chamada a fazer, recorrendo ao auxílio do Coração
da Mãe de Cristo e nossa Mãe.
11. E como é que se apresenta hoje diante da Santa Mãe que gerou o
Filho de Deus, no seu Santuário de Fátima, João Paulo II, sucessor de Pedro e
continuador da obra de Pio, de João e de Paulo e particular herdeiro do
Concílio Vaticano II?
Apresenta-se com ansiedade, a fazer a releitura, daquele
chamamento materno à penitência e à conversão, daquele apelo ardente do Coração
de Maria, que se fez ouvir aqui em Fátima, há sessenta e cinco anos. Sim,
relê-o, com o coração amargurado, porque vê quantos homens, quantas
sociedades e quantos cristãos foram indo em direcção oposta àquela que
foi indicada pela mensagem de Fátima. O pecado adquiriu assim um forte direito
de cidadania e a negação de Deus difundiu-se nas ideologias, nas concepções e
nos programas humanos!
E precisamente por isso, o convite evangélico à penitência e à
conversão, expresso com as palavras da Mãe, continua ainda actual. Mais
actual mesmo do que há sessenta e cinco anos atrás. E até mais urgente. É por
isso também que tal convite será o assunto do próximo Sínodo dos Bispos,
no ano que vem, Sínodo para o qual já nos estamos a preparar.
O sucessor de Pedro apresenta-se aqui também como testemunha
dos imensos sofrimentos do homem, como testemunha das ameaças quase
apocalípticas, que pesam sobre as nações e sobre a humanidade. E procura abraçar
esses sofrimentos com o seu fraco coração humano, ao mesmo tempo que se põe bem
diante do mistério do Coração: do Coração da Mãe, do Coração Imaculado de Maria.
Em virtude desses sofrimentos, com a consciência do mal que
alastra pelo mundo e ameaça o homem, as nações e a humanidade o sucessor de
Pedro apresenta-se aqui com uma fé maior na redenção do mundo: fé
naquele Amor salvífico que é sempre maior, sempre mais forte do que todos os
males.
Assim, se por um lado o coração se confrange, pelo sentido elo
pecado do mundo, bem como pela série de ameaças que aumentam no mundo, por outro
lado, o mesmo coração humano sente-se dilatar com a esperança, ao pôr em
prática uma vez mais aquilo que os meus Predecessores já fizeram: entregar e
confiar o mundo ao Coração da Mãe, confiar-Lhe especialmente aqueles povos, que,
de modo particular, tenham necessidade disso. Este acto equivale a entregar e a
confiar o mundo Àquele que é Santidade infinita. Esta Santidade significa
redenção, significa amor mais forte do que o mal. Jamais algum “pecado do mundo”
poderá superar este Amor.
Uma vez mais. Efectivamente, o apelo de Maria não é para
uma vez só. Ele continua aberto para as gerações que se renovam, para ser
correspondido de acordo com os “sinais dos tempos” sempre novos. A ele se deve
voltar incessantemente. Há que retomá-lo sempre de novo.
12. Escreve o Autor do Apocalipse:
“Vi depois a cidade santa, a nova Jerusalém, que descia do Céu, da
presença de Deus, pronta como noiva adornada para o seu esposo. E, do trono,
ouvi uma voz potente que dizia: Eis a morada de Deus entre os homens. Deus há-de
morar entre eles: eles mesmos serão o Seu povo e Ele próprio – Deus-com-eles –
será o Seu Deus” (Apoc. 21, 2ss).
A Igreja vive desta fé.
Com tal fé caminha o Povo de Deus.
“A morada de Deus entre os homens” já está sobre a terra.
E nela está o Coração da Esposa e da Mãe, Maria Santíssima,
adornado com a gema da Imaculada Conceição: o Coração da Esposa e da Mãe, aberto
junto da Cruz pela palavra do Filho, para um novo e grande amor do homem e do
mundo. O Coração da Esposa e da Mãe, cônscio de todos os
sofrimentos dos homens e das sociedades sobre a face da terra.
O Povo de Deus é peregrino pelos caminhos deste mundo na
direcção escatológica. Está em peregrinação para a eterna Jerusalém, para a
“morada de Deus entre os homens”.
Lá, onde Deus “há-de enxugar-lhes dos olhos todas as
lágrimas; a morte deixará de existir, e não mais haverá luto, nem clamor,
nem fadiga. O que havia anteriormente desapareceu” (Cfr. Apoc. 21, 4).
Mas “o que havia anteriormente” ainda perdura. E é isso
precisamente que constitui o espaço temporal da nossa peregrinação.
Por isso, olhemos para “Aquele que está sentado no trono” que diz:
“Vou renovar todas as coisas” (Cfr. Ibid. 21, 5).
E juntamente com o Evangelista e Apóstolo procuremos ver com os
olhos da fé “o novo céu e a nova terra”, porque o “primeiro céu e a primeira
terra” já passaram...
Entretanto, até agora, “o primeiro céu e a primeira terra”
continuam, estando sempre à nossa volta e dentro de nós. Não podemos ignorá-lo.
Isso permite-nos, no entanto reconhecer que graça imensa foi concedida ao homem
quando no meio deste peregrinar, no horizonte da fé dos nossos tempos, se
acendeu esse “Sinal grandioso: uma Mulher”!
Sim, verdadeiramente podemos repetir: “Abençoada sejas, filha,
pelo Deus altíssimo, mais que todas as mulheres sobre a Terra!
... Procedendo com rectidão, na presença do nosso Deus,
... Aliviaste o nosso abatimento”.
Verdadeiramente, Bendita sois Vós!
Sim, aqui e em toda a Igreja, no coração de cada um dos homens e
no mundo inteiro: sede bendita ó Maria, nossa Mãe dulcíssima!
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1982 - Libreria Editrice Vaticana
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ORAÇÃO DO PAPA JOÃO PAULO II
DE ENTREGA, DE CONFIANÇA E DE CONSAGRAÇÃO
AO IMACULADO CORAÇÃO DE MARIA
DE ENTREGA, DE CONFIANÇA E DE CONSAGRAÇÃO
AO IMACULADO CORAÇÃO DE MARIA
“À vossa protecção nos acolhemos, Santa Mãe de Deus”!
Ao pronunciar
estas palavras da antífona
com que a Igreja de Cristo
reza há séculos,
encontro-me hoje neste lugar
escolhido por Vós, ó Mãe,
e por Vós especialmente amado.
com que a Igreja de Cristo
reza há séculos,
encontro-me hoje neste lugar
escolhido por Vós, ó Mãe,
e por Vós especialmente amado.
Estou aqui, unido com todos os Pastores da Igreja
por aquele vínculo particular,
pelo qual constituímos
um corpo e um colégio,
assim como Cristo quis os Apóstolos
em unidade com Pedro.
por aquele vínculo particular,
pelo qual constituímos
um corpo e um colégio,
assim como Cristo quis os Apóstolos
em unidade com Pedro.
No vínculo desta unidade,
pronuncio as palavras deste Acto,
no qual desejo incluir, uma vez mais,
as esperanças e as angústias
da Igreja no mundo contemporâneo.
pronuncio as palavras deste Acto,
no qual desejo incluir, uma vez mais,
as esperanças e as angústias
da Igreja no mundo contemporâneo.
Há quarenta anos atrás,
e depois ainda passados dez anos,
o Vosso servo o Papa Pio XII,
tendo diante dos olhos
as dolorosas experiências da família humana,
confiou e consagrou
ao Vosso Coração Imaculadotodo o mundo
e especialmente os Povos
que eram objecto
particular do vosso amor
e da vossa solicitude.
e depois ainda passados dez anos,
o Vosso servo o Papa Pio XII,
tendo diante dos olhos
as dolorosas experiências da família humana,
confiou e consagrou
ao Vosso Coração Imaculadotodo o mundo
e especialmente os Povos
que eram objecto
particular do vosso amor
e da vossa solicitude.
Este mundo dos homens
e das naçõestambém eu o tenho diante dos olhos, hoje,
no momento em que desejo renovar
a entrega e a consagração
feita pelo meu Predecessor
na Sé de Pedro:
o mundo do Segundo Milénio
que está prestes a terminar,
o mundo contemporâneo,
o nosso mundo de hoje!
e das naçõestambém eu o tenho diante dos olhos, hoje,
no momento em que desejo renovar
a entrega e a consagração
feita pelo meu Predecessor
na Sé de Pedro:
o mundo do Segundo Milénio
que está prestes a terminar,
o mundo contemporâneo,
o nosso mundo de hoje!
A Igreja,
lembrada das palavras do Senhor:
“Ide... e ensinai todas as nações...
Eis que eu estou convosco todos os dias,
até ao fim do mundo” (Mt 28, 19-20),
no Concílio Vaticano II,
renovou a consciência
da sua missão neste mundo.
lembrada das palavras do Senhor:
“Ide... e ensinai todas as nações...
Eis que eu estou convosco todos os dias,
até ao fim do mundo” (Mt 28, 19-20),
no Concílio Vaticano II,
renovou a consciência
da sua missão neste mundo.
Por isso, ó Mãe dos homens e dos povos,
Vós que “conheceis todos os seus sofrimentos
e as suas esperanças”,
Vós que sentis maternamente todas as lutas
entre o bem e o mal,
entre a luz e as trevas,
que abalam o mundo contemporâneo,
acolhei o nosso clamor
que movidos pelo Espírito Santo,
elevamos directamente
ao Vosso Coração,
e abraçai com o amor da Mãe e da Serva
este nosso mundo humano,
que Vos confiamos e consagramos,
cheios de inquietação pela sorte terrena
e eterna dos homens e dos povos.
Vós que “conheceis todos os seus sofrimentos
e as suas esperanças”,
Vós que sentis maternamente todas as lutas
entre o bem e o mal,
entre a luz e as trevas,
que abalam o mundo contemporâneo,
acolhei o nosso clamor
que movidos pelo Espírito Santo,
elevamos directamente
ao Vosso Coração,
e abraçai com o amor da Mãe e da Serva
este nosso mundo humano,
que Vos confiamos e consagramos,
cheios de inquietação pela sorte terrena
e eterna dos homens e dos povos.
De modo especial
Vos entregamos e consagramos
aqueles homens e aquelas nações,
que desta entrega e desta consagração
particularmente têm necessidade.
Vos entregamos e consagramos
aqueles homens e aquelas nações,
que desta entrega e desta consagração
particularmente têm necessidade.
“À Vossa protecção
nos acolhemos Santa Mãe de Deus”!
nos acolhemos Santa Mãe de Deus”!
Não desprezeis as nossas súplicas,
pois nos encontramos na provação!
Não desprezeis!
pois nos encontramos na provação!
Não desprezeis!
Acolhei a nossa humilde confiança
e a nossa entrega!
e a nossa entrega!
2. “Porque Deus amou de tal modo o mundo
que lhe deu o seu Filho unigénito,
para que todo aquele que n’Ele crer,
não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo. 3, 16).
Precisamente este amor
fez com que o Filho de Deus
se tenha consagrado a si mesmo:
“Eu consagro-me por eles,
para eles serem também consagrados
na verdade” (Ibid. 17, 19).
que lhe deu o seu Filho unigénito,
para que todo aquele que n’Ele crer,
não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo. 3, 16).
Precisamente este amor
fez com que o Filho de Deus
se tenha consagrado a si mesmo:
“Eu consagro-me por eles,
para eles serem também consagrados
na verdade” (Ibid. 17, 19).
Em virtude desta consagração,
os discípulos de todos os tempos
são chamados
a empenhar-se pela salvação do mundo,
a ajuntar alguma coisa
aos sofrimentos de Cristo
em benefício do Seu Corpo,
que é a Igreja (Cfr. 2Cor. 12, 15; Col 1, 24).
os discípulos de todos os tempos
são chamados
a empenhar-se pela salvação do mundo,
a ajuntar alguma coisa
aos sofrimentos de Cristo
em benefício do Seu Corpo,
que é a Igreja (Cfr. 2Cor. 12, 15; Col 1, 24).
Diante de Vós,
Mãe de Cristo,
diante de Vosso Coração Imaculado,
desejo eu, hoje,
juntamente com toda a Igreja,
unir-me com o nosso Redentor
nesta sua consagração pelo mundo e pelos homens,
a qual só no seu Coração divino
tem o poder de alcançar o perdão
e de conseguir a reparação.
Mãe de Cristo,
diante de Vosso Coração Imaculado,
desejo eu, hoje,
juntamente com toda a Igreja,
unir-me com o nosso Redentor
nesta sua consagração pelo mundo e pelos homens,
a qual só no seu Coração divino
tem o poder de alcançar o perdão
e de conseguir a reparação.
A força desta consagraçãopermanece por todos os
tempos
e abarca todos os homens,
os povos e as nações,
e supera todo o mal,
que o espírito das trevas
é capaz de despertar
no coração do homem e na sua história,
e que, de facto,
despertou nos nossos tempos.
e abarca todos os homens,
os povos e as nações,
e supera todo o mal,
que o espírito das trevas
é capaz de despertar
no coração do homem e na sua história,
e que, de facto,
despertou nos nossos tempos.
A esta consagração do nosso Redentor,
mediante o serviço do sucessor de Pedro,
une-se a Igreja, Corpo místico de Cristo.
mediante o serviço do sucessor de Pedro,
une-se a Igreja, Corpo místico de Cristo.
Oh! quão profundamente
sentimos a necessidade de consagração,
pela humanidade e pelo mundo:
para nosso mundo contemporâneo,
na unidade com o próprio Cristo!
Na realidade, a obra redentora de Cristo
deve ser participada pelo mundo
pela mediação da Igreja.
sentimos a necessidade de consagração,
pela humanidade e pelo mundo:
para nosso mundo contemporâneo,
na unidade com o próprio Cristo!
Na realidade, a obra redentora de Cristo
deve ser participada pelo mundo
pela mediação da Igreja.
Oh! quanto nos penaliza,
portanto,
tudo aquilo que na Igreja
e em cada um de nós
se opõe à santidade e à consagração!
Quanto nos penaliza
que o convite à penitência,
à conversão, à oração,
não tenha encontrado aquele acolhimento que devia!
portanto,
tudo aquilo que na Igreja
e em cada um de nós
se opõe à santidade e à consagração!
Quanto nos penaliza
que o convite à penitência,
à conversão, à oração,
não tenha encontrado aquele acolhimento que devia!
Quanto nos penaliza
que muitos participem
tão friamente
na obra da Redenção de Cristo!
Que tão insuficientemente
se complete na nossa carne
“aquilo que falta aos sofrimentos de Cristo!” (Col 1, 24).
que muitos participem
tão friamente
na obra da Redenção de Cristo!
Que tão insuficientemente
se complete na nossa carne
“aquilo que falta aos sofrimentos de Cristo!” (Col 1, 24).
Sejam benditas portanto,
todas as almas
que obedecem à chamada do Amor eterno!
Sejam benditos aqueles que,
dia após dia,
com generosidade inexaurível
acolhem o Vosso convite,
ó Mãe, para fazer aquilo que diz o Vosso Jesus (Cfr. Io 2, 5)
e dão à Igreja e ao mundo
um testemunho sereno de vida inspirada no Evangelho.
todas as almas
que obedecem à chamada do Amor eterno!
Sejam benditos aqueles que,
dia após dia,
com generosidade inexaurível
acolhem o Vosso convite,
ó Mãe, para fazer aquilo que diz o Vosso Jesus (Cfr. Io 2, 5)
e dão à Igreja e ao mundo
um testemunho sereno de vida inspirada no Evangelho.
Sede bendita,
acima de todas as criaturas,
Vós, Serva do Senhor,
que mais plenamente obedeceis a este Divino apelo!
acima de todas as criaturas,
Vós, Serva do Senhor,
que mais plenamente obedeceis a este Divino apelo!
Sede louvada,
Vós que estais inteiramente unida
à consagração redentora do Vosso Filho!
Vós que estais inteiramente unida
à consagração redentora do Vosso Filho!
Mãe da Igreja!Iluminai o Povo de Deus
nos caminhos da fé, da esperança e da caridade!
Ajudai-nos a viver
com toda a verdade da consagração de Cristo
pela inteira família humana, no mundo contemporâneo.
nos caminhos da fé, da esperança e da caridade!
Ajudai-nos a viver
com toda a verdade da consagração de Cristo
pela inteira família humana, no mundo contemporâneo.
3. Confiando-Vos, ó Mãe,
o mundo,
todos os homens e todos os povos,
nós Vos confiamos também
a própria consagração em favor do mundo,
depositando-a no Vosso Coração materno.
o mundo,
todos os homens e todos os povos,
nós Vos confiamos também
a própria consagração em favor do mundo,
depositando-a no Vosso Coração materno.
Oh, Coração Imaculado!
Ajudai-nos a vencer a ameaça do mal
que tão facilmente se enraíza
nos corações dos homens de hoje e que,
nos seus efeitos incomensuráveis,
pesa já sobre a nossa época
e parece fechar os caminhos do futuro!
Ajudai-nos a vencer a ameaça do mal
que tão facilmente se enraíza
nos corações dos homens de hoje e que,
nos seus efeitos incomensuráveis,
pesa já sobre a nossa época
e parece fechar os caminhos do futuro!
Da fome e da guerra, livrai-nos!
Da guerra nuclear, de uma autodestruição incalculável e de toda
espécie de guerra, livrai-nos!
Dos pecados contra a vida do homem desde os seus primeiros
instantes, livrai-nos!
Do ódio e do aviltamento da dignidade dos filhos de Deus,
livrai-nos!
De todo o género de injustiça na vida social, nacional e
internacional, livrai-nos!
Da facilidade em calcar aos pés os mandamentos de Deus,
livrai-nos!
Dos pecados contra o Espírito Santo, livrai-nos,
livrai-nos!
Acolhei, ó Mãe de Cristo,
este clamor carregado do sofrimentode todos os homens!
Carregado do sofrimento de sociedades inteiras!
este clamor carregado do sofrimentode todos os homens!
Carregado do sofrimento de sociedades inteiras!
Que se revele,
uma vez mais, na história do mundo,
a força infinita do Amor misericordioso!
Que ele detenha o mal!
Que ele transforme as consciências!
Que se manifeste para todos,
no Vosso Coração Imaculado,
a luz da Esperança!
uma vez mais, na história do mundo,
a força infinita do Amor misericordioso!
Que ele detenha o mal!
Que ele transforme as consciências!
Que se manifeste para todos,
no Vosso Coração Imaculado,
a luz da Esperança!
Quero dirigir-vos ainda uma oração especial,
ó Mãe que conheceis as ansiedades e as preocupações dos vossos filhos.
Suplico-vos,
em imploração ardente e dorida
que interponhais a vossa intercessão pela paz no mundo,
pela paz entre os povos que,
em diversas partes,
contrastes de interesses nacionais e actos de prepotência injusta
opõem sangrentamente entre si.
ó Mãe que conheceis as ansiedades e as preocupações dos vossos filhos.
Suplico-vos,
em imploração ardente e dorida
que interponhais a vossa intercessão pela paz no mundo,
pela paz entre os povos que,
em diversas partes,
contrastes de interesses nacionais e actos de prepotência injusta
opõem sangrentamente entre si.
Suplico-vos, em particular, que cessem as hostilidades que dividem
já, há muitos dias, dois grandes Países nas águas do Atlântico
meridional,causando dolorosas perdas de vidas humanas. Fazei com que se encontre
finalmente uma solução justa e honrosa entre as duas Partes, não apenas pela
controvérsia que as divide e ameaça com consequências imprevisíveis, mas também,
e sobretudo para o restabelecimento entre elas da mais digna e mais profunda
harmonia, como convém à sua História, à sua civilização e às suas tradições
cristãs.
Que em breve a grave e preocupante controvérsia seja superada e
concluída, de tal maneira que também se possa realizar felizmente a minha
projectada viagem pastoral à Grã-Bretanha, para ser satisfeito não só o meu
desejo pessoal, mas também o de todos aqueles que esperam ardentemente esta
visita e que com tanto empenho e com todo o coração a têm vindo a preparar.
Fátima, 13 de Maio de 1982