Em dezembro de 2011, mons. Dominique Rey, bispo Fréjus-Toulon no Sul da França, erigiu o Monastère Saint-Benoît, uma nova comunidade monástica que segue a Regra de São Bento e celebra a Sagrada Liturgia de acordo com as antigas e clássicas formas dos ritos romano e monástico. O superior, Dom Aidan, deu esta entrevista – a qual, pelo que sei, é a primeira dada por essa comunidade monástica.
Nosso agradecimento a um caro amigo pela gentileza de nos enviar esta tradução.
NLM: Dom Prior, o senhor nos poderia falar sobre as origens deste mosteiro?
A origem do nosso mosteiro jaz no nosso antigo desejo de viver a vida monacal de acordo com a Regra de São Bento. Alguns dentre nós éramos já monges beneditinos formados e professos, mas que nos encontrávamos frustrados em não viver nossa vocação por circunstâncias que escapavam ao nosso controle. Outros, também, experimentavam essa dificuldade, mas desejavam ainda ser monges. O tempo passado fora da vida monástica, por doloroso que fosse, concentrou nosso desejo de viver a vida monacal tradicional e experimentar, a cada dia, sua harmonia natural com os ritos litúrgicos e ofícios monásticos clássicos. Através de circunstâncias que foram verdadeiramente providenciais, pudemos expressar esse desejo ao bispo mons. Rey.
O bispo nos recebeu como um verdadeiro pai. Nossa consulta iniciou um período de discernimento e preparação prática que envolveu a equipa do próprio bispo, nós, meu bispo (o qual demostrou, também, grande solicitude paternal, afabilidade e generosidade) e o apoio e generosidade de muitos amigos – sem mencionar as calorosas boas-vindas dos habitantes de La Garde-Freinet. Um tanto que para nosso – ainda que feliz – assombro, foi possível dar início a um completo horarium monástico já para o primeiro domingo do Advento e celebrar nossa ereção canónica nas Solenes Primeiras Vésperas da Imaculada Conceição, dezembro último.
NLM: Que apoio vocês receberam da Diocese de Fréjus-Toulon e de seu bispo?
O bispo e a diocese foram, e permanecem, completamente favoráveis. A abordagem de mons. Rey é a de perguntar sempre como ele, como bispo, pode encorajar e promover o crescimento da Igreja. Ele quer colocar-se a si e a sua diocese por trás de iniciativas que ele acredita ampliarão o Reino de Deus na terra. Ele busca por soluções, não problemas. Do mesmo modo, age a sua equipa – desde o vigário geral, seus secretários e canonistas, seu diretor financeiro etc. Todos trabalham juntos a fim de edificar a Igreja – de maneira segura, em bases financeiras e canónicas também!
Foi-nos dado o uso de um presbitério bastante largo (que já estamos na feliz situação de nos preocupar acerca de ser muito pequeno) próximo à igreja paroquial. Foi-nos dado o uso da igreja para todos os nossos ofícios litúrgicos. O cura, que nos recebeu calorosamente, vive em outra vila, da qual é cura também, e celebra três missas aqui a cada semana para a pequena e muito empenhada comunidade local. Esta “partilha” da igreja funciona bem e provém a Missa e o Ofício aqui cada dia em acréscimo às já existentes Missas paroquiais.
O bispo deu-nos, ainda, generosamente, auxílio financeiro para começarmos –os custos só do seguro de saúde na França são astronómicos – mas nós precisamos trabalhar para nos tornar financeiramente autossuficientes rapidamente.
Suporte prático e financeiro nos chegou de toda a diocese e, de fato, do clero e povo local, que, assim como o encorajamento, proveu-nos com muito do material necessário a essa grande casa. Um mosteiro é algo diferente e novo, mas a sua chegada foi felicitada com a hospitalidade e abertura pelas quais o povo e o clero desta diocese são conhecidos.
NLM: Vocês são parte da Confederação Beneditina mundial?
Embora dois de nós tenhamos completado válidos noviciados beneditinos e sido monges professos da Confederação, nossa comunidade foi estabelecida pelo bispo e é da diocese. Isso não quer dizer que nós estejamos isolados: muitos monges da Confederação são bons amigos e nós temos a felicidade de receber encorajamentos fraternos e ajuda. Um amigo que é abade aceitou o convite a nos assistir a ambos, a comunidade e o bispo, enquanto nós crescemos. Nós pedimos ao abade para dar especial assistência na formação dos noviços. Assim, embora sejamos independentes da Confederação, mantemos fortes laços com seus monges e apreciamos muito suas visitas, seu suporte e a sabedoria e a experiência que eles dividem conosco.
NLM: Conte-nos sobre o horarium e a vida litúrgica do mosteiro.
Nosso horarium é simples, começa com as matinas às 4:00 da manhã e termina com as completas às 8:00 da noite. Inclui todos os ofícios cantados de acordo com o Breviarium monasticum (1963) e a Missa conventual de acordo com o usus antiquior. O horarium não é um artifício publicitário nem uma fantasia – ele é real – e deve ser dito que, embora exigente, é um gozo a viver.
Na nossa vida litúrgica nós “ousamos fazer o máximo que nós podemos” como impelia Santo Tomás de Aquino. Posto que somos pequenos, é por vezes necessariamente modesta. Mas cantar fielmente todo o ofício monástico cada dia não é uma tarefa pequena. Quanto mais crescemos, mais se torna possível, e cada nova vocação é um dom da Divina Providência permitindo a toda a família monástica louvar a Deus mais plenamente na sagrada liturgia.
Com certeza a vida litúrgica é a vida do mosteiro. Isso é nossa razão de ser. Estamos aqui primeira e principalmente para prestar culto a Deus, para “não colocar nada antes do trabalho de Deus” como ensina São Bento. Isto nos dá uma clara identidade e ordena o nosso dia e, de novo, é um gozo. É uma particular alegria que, graças à visão e legislação do Santo Padre (a qual é, de todo coração, compartilhada, apoiada e promovida por mons. Rey), o uso dos antigos ritos litúrgicos não é um problema. Não há controvérsia em gastarmos nossos dias e noites cantando os louvores do Senhor ou oferecendo o Santo Sacrifício da Missa do modo como os monges fizeram por séculos, como, aliás, não deve haver!
NLM: Como o senhor enxerga o mosteiro participando e advogando pelo novo movimento litúrgico querido pelo Papa Bento?
Nós somos uma pequena comunidade monástica vivendo a vida litúrgica tão completa e fielmente quanto nos é possível. Nós buscamos dar a Deus Todo-poderoso o culto que Lhe é de direito e, agindo assim, aprofundar nossa própria conversão de vida em conformidade com os Seus caminhos. Assim, como nós entendemos, o “novo movimento litúrgico” é primeiro sobre tornar-me litúrgico a mim mesmo, sobre mergulhar na sagrada liturgia, deixa-la formar quem eu sou e como eu vivo, permitindo-lhe trazer aquela conversão de vida que é o coração mesmo da Regra de São Bento.
Não temos nenhuma pretensão de fazer alguma grande contribuição em larga escala. Mas se, a cada dia, nós pudermos fiel e generosamente viver a vida litúrgica, isso mesmo fará sua própria pequena diferença na Igreja e no mundo. Na Divina Providência, nós tomaremos parte neste aprofundamento do novo movimento litúrgico.
Obviamente, nós oferecemos um testemunho monástico e litúrgico e isso tem seus efeitos. Nossa inauguração foi celebrada com as solenes primeiras vésperas da Imaculada Concepção – inteiramente cantada de acordo com o rito monástico. Amigos, clérigos eparoquianos locais e alguns que não adentravam uma igreja por um bom tempo, juntaram-se para a oração das vésperas – muitos pela primeira vez – e eles cantaram muito bem! A liturgia da Igreja, resplendente na plenitude da tradição monástica, tocou muitos corações aquele entardecer. Se nós pudermos continuar fazendo isso – e nós podemos –, isso, também, fará sua contribuição.
NLM: O que um homem que pensa em entrar na vida monástica deve esperar se ele pede para juntar-se à sua comunidade?
Ele seria bem-vindo para uma curta visita a fim de experimentar um pouco da nossa vida: falar é uma coisa, outra é experimentar a vida em primeira mão, o que é necessário. Depois disso, uma visita mais longa para um maior aprofundamento seria apropriada – normalmente, ao menos, um mês. Se, então, ele desejar requerer a entrada no mosteiro, teriam lugar os procedimentos de entrada seguido pelo postulantado (o qual, usualmente, dura ao menos três meses, mas que é flexível) e, então, pelo noviciado (o qual dura um ano ou um ano e meio).
NLM: E que formação se seguiria?
Durante o postulantado e noviciado a formação é centrada na vida monástica e oração: a Regra, história monástica, sagrada liturgia e salmodia etc. Latim e, dada a nossa localidade, francês podem ser estudados, também. Depois da profissão simples, a formação é de acordo com os dons pessoais e as necessidades do mosteiro. Alguns tomarão o caminho dos estudos para a ordenação enquanto outros desenvolverão suas habilidades em outras áreas – nossa família monástica tem lugar para todos aqueles que Deus Todo-poderoso envia, sejam eles o que usualmente se chama “irmãos leigos” ou “monges de coro”. Estudos mais avançados são, também, algo que desejamos incentivar onde o indivíduo tem os dons necessários e onde eles podem servir ao mosteiro e à Igreja.
Mas para tudo isso, a maior formação para qualquer postulante ou noviço é esforçar-se para ser fiel às muitas demandas do nosso cotidiano com seus desafios e, por vezes, verdadeiras dificuldades. Perseverar através disso habilita os vocacionados ao monacato àquela conversão de vida que é nossa vocação e a experimentar algumas de suas delícias, junto com seus irmãos numa fraternidade ordenada, uma “escola do serviço do Senhor”. É difícil de explicar, mas para aqueles chamados a isso, é real, sustentável, uma verdadeira graça e privilégio. Como cantamos na prima de domingo, “Viam mandatorum tuorum cucurri, cum dilatasti cor meum.” (“Corri pelo caminho dos teus mandamentos, quando dilataste o meu coração.” – Psalmus CXVIII, 32)
NLM: Vocês têm noviços atualmente?
No momento nós não tivemos, sequer, tempo para correr o tempo de um postulantado! Nós temos dois sérios candidatos ao noviciado e, Deus o queira, eles serão investidos no decorrer desse ano. Há outros candidatos planejando fazer mais extensas visitas. É importante não apressar o discernimento e permitir a cada candidato o tempo, espaço e liberdade necessários para dar os passos certos no tempo certo. Nós preferimos não falar muito sobre quem e quando e assim por diante a fim de proteger a liberdade: eles – e também os monges – têm direito a sua privacidade.
NLM: O mosteiro é inteiramente anglófono?
Não exclusivamente. Embora nós certamente falemos inglês, cada um de nós deve aprender francês. Estamos abertos a todos que Deus enviar. De fato, nosso bispo confiou-nos recentemente a formação final de um seminarista e ele não é um falante de inglês – assim, nosso francês está se aperfeiçoando o tempo todo! Quando nós pregamos, usamos ambos o francês e o inglês – muitos dentre o povo local são falantes nativos da língua inglesa.
NLM: Que ofícios os membros da comunidade fazem?
Nosso primeiro ofício é a oração e nossa conversão de vida. Depois, há o trabalho necessário de discernimento e formação de candidatos. Depois disso, seguem todas as tarefas administrativas e domésticas, como cozinhar, limpar, responder correspondências e pagar contas.
Nós ainda cuidamos de uma pequena loja e produzimos nós mesmos algumas das coisas vendidas lá, assim como imprimimos cartões e outros itens. Esperamos fazer algumas publicações. Temos o uso de uma pequena terra para produzir alimentos. Algumas vezes tutoramos pessoas nas áreas académica ou litúrgica ou fazemos outro trabalho intelectual. Acolhemos convidados e retirantes e provemos algum cuidado pastoral de pessoas nos antigos ritos. De tempos em tempos assistimos o bispo em diferentes projetos.
Além do básico, nosso trabalho será uma resposta às oportunidades, talentos e necessidades que a Divina Providência nos enviar, cuidando para que tudo isso não eclipse o trabalho de Deus.
NLM: Onde vocês estão situados? É possível às pessoas visitarem?
Estamos numa vila no alto da cadeia de montanhas “des Maures”, entre Fréjus e Toulon, na Provença. Estamos a pouco mais de 10 quilômetros do mar mediterrâneo, e 20 quilômetros ao norte de Saint-Tropez. É uma região excepcionalmente bonita, e nossa vila usufrui dos benefícios de ser pequena e quieta. Tem esplêndidas vistas, com muitos caminhos montanhosos – ideal para pessoas em retiro. Nós colocamos algumas fotos em nosso website.
E sim, visitantes são sempre bem-vindos, seja para participar do Ofício ou da Missa (os quais são abertos ao público), seja para ficar alguns dias em descanso ou retiro. Homens que queiram ficar no mosteiro devem sempre nos contatar antecipadamente, é claro, mas a hospitalidade é uma importante parte da nossa vocação.
Querendo chegar aqui, há alguns ônibus que vêm da vila – mais nos finais-de-semana e verão – e há uma grande estação ferroviária (Les Arcs) não muito distante. Todavia, automóvel é o mais conveniente meio de transporte e há uma boa estrada até desde a costa e uma outra desde a grande rodovia provençal (A8). Nós estamos a menos de trinta minutos de carro.
NLM: Como as pessoas podem ajudar o mosteiro?
Primeiro, eu devo recordar nossa gratidão aos muitos benefícios, pequenos e grandes, que recebemos até aqui. Nós temos nos movimentado continuamente através da bondade da Divina Providência trabalhando através de tantos corações generosos. Que nós tenhamos podido começar bem nossa vida aqui é em não menor parte devido à caridade desses indivíduos – cujos atos são conhecidos por Deus Todo-poderoso – e por quem nós rezamos a cada dia e oferecemos a Missa a cada mês.
Como eu disse antes, sim, nós precisamos nos tornar financeiramente independentes rapidamente. Com a chegada de novas vocações essa necessidade não é menor. Auxílio e benefícios são sempre bem-vindos, e são uma verdadeira bênção. Embora nosso website mencione várias maneiras de nos ajudar – adquirindo bens através dos nossos links na Amazon, enviando algo da nossa lista de desejos na Amazon (nós necessitamos real e especialmente construir nossa biblioteca), comprando da loja do nosso mosteiro, fazendo uma doação, enviando intenções de Missa etc. – nós somos cônscios de que precisamos dar duro e desenvolver indústrias e a nós mesmos. Isto requer tanto pessoal quanto capital – mas a Divina Providência não faltará desde que sejamos fiéis à nossa vocação monástica.
NLM: Vocês têm algum programa de oblatos?
Sim, e nós tivemos a alegria de fazer a tomada de hábito de nosso primeiro oblato-noviço, um padre diocesano e grande amigo do mosteiro, logo depois de nossa inauguração. Oblatos são a extensão de nossa família, e assim sendo, compartilham dos frutos espirituais de nossas orações bem como nós nos beneficiamos de sua fraternidade e auxílio. Homens e mulheres católicos interessados na oblação devem consultar nosso website.
NLM: Dom Aidan, o que o futuro reserva para o Mosteiro de São Bento?
Ele reserva o próximo ofício monástico, a próxima oportunidade de exercer a caridade fraterna com os irmãos, a próxima ocasião de suportar o sofrimento em fé e esperança, a próxima oportunidade de acolher como ao Cristo a pessoa que vem ao mosteiro e talveznão esteja sequer ciente da necessidade de buscar a Deus. E se eu sou fiel ao que a Regra demanda em cada uma dessas circunstâncias, o futuro reserva – não, ele promete – que Deus seja louvado e encontrado, e então, eu serei mais conformado a Ele.
Certamente, temos esperanças e planos, mas a Providência embaralhá-los-á e dividi-los-á de acordo com um Plano maior. Nós veremos o que o futuro reserva. Mas se essa comunidade for fiel à Regra e atenta à voz de Deus, o futuro, seja qual for, será de Deus.
Deus vos abençoe a ti e a teus leitores!
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Para mais informações acerca do mosteiro:
Monastère Saint-Benoît
2, rue de la Croix
83680 La Garde-Freinet
France
Website: www.msb-lgf.org
© Monastère Saint-Benoît 2012
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- E senti o espírito inundado por um mistério de luz que é Deus e N´Ele vi e ouvi -A ponta da lança como chama que se desprende, toca o eixo da terra, – Ela estremece: montanhas, cidades, vilas e aldeias com os seus moradores são sepultados. - O mar, os rios e as nuvens saem dos seus limites, transbordam, inundam e arrastam consigo num redemoinho, moradias e gente em número que não se pode contar , é a purificação do mundo pelo pecado em que se mergulha. - O ódio, a ambição provocam a guerra destruidora! - Depois senti no palpitar acelerado do coração e no meu espírito o eco duma voz suave que dizia: – No tempo, uma só Fé, um só Batismo, uma só Igreja, Santa, Católica, Apostólica: - Na eternidade, o Céu! (escreve a irmã Lúcia a 3 de janeiro de 1944, em "O Meu Caminho," I, p. 158 – 160 – Carmelo de Coimbra)