domingo, 24 de maio de 2009

Bento XVI: Em Cristo que subiu ao céu, o ser humano entrou de modo novo e inaudito na intimidade de Deus ...


Fotos de Bento XVI neste domingo de manhã, na praça central de Cassino, aos pés da colina onde emerge majestosa a abadia beneditina de Montecassino






O sentido da Ascensão do Senhor e a herança espiritual de São Bento – foram sublinhados por Bento XVI na homilia da Missa celebrada neste domingo de manhã, na praça central de Cassino, aos pés da colina onde emerge majestosa a abadia beneditina de Montecassino, reconstruída após a destruição sofrida há 65 anos, na II Guerra Mundial.

“Em Cristo que subiu ao céu, o ser humano entrou de modo novo e inaudito na intimidade de Deus; doravante o homem encontra, para sempre, espaço em Deus.
O céu não indica um lugar por cima das estrelas, mas algo de muito mais ousado e sublime: indica o próprio Cristo, a Pessoa divina que acolhe, plenamente e para sempre, a humanidade – Aquele no qual Deus e o homem estão para sempre inseparavelmente unidos”.

“Aproximamo-nos do céu, melhor ainda, entramos no céu, na medida em que nos aproximamos de Jesus e entramos em comunhão com Ele” – sublinhou ainda o Papa. A solenidade da Ascensão convida a uma profunda comunhão com Jesus, invisivelmente presente na vida de cada um de nós. Compreende-se, assim, por que é que o evangelista Lucas afirma que, depois da Ascensão, os discípulos tornaram a Jerusalém “cheios de alegria”.

“A causa da alegria deles era o facto de o que tinha acontecido não ter sido, na realidade, uma separação: antes, eles tinham agora a certeza de que o Crucificado - Ressuscitado estava vivo, e n’Ele se encontravam para sempre abertas para a humanidade as portas da vida eterna.
Por outras palavras, a Ascensão não comportava a sua ausência temporária do mundo, mas inaugurava, isso sim, a nova, definitiva e insuprível forma da sua presença, em virtude da sua participação na potência régia de Deus”.

Tocará aos discípulos, animados pela potência do Espírito Santo, tornar perceptível a Sua presença com o testemunho, a pregação e o empenho missionário.

“A solenidade das Ascensão do Senhor deveria encher-nos de serenidade e de entusiasmo, precisamente como aconteceu com os Apóstolos que regressaram do Monte das Oliveiras cheios de alegria.
Como eles, também nós, acolhendo o convite dos dois homens vestidos de branco, não devemos ficar bloqueados a olhar para o céu, mas – sob a guia do Espírito Santo – devemos ir por toda a parte e proclamar o anúncio salvífico da morte e ressurreição de Cristo”.

A partir do “carácter histórico do mistério da ressurreição e ascensão de Cristo”, Bento XVI referiu “a condição transcendente e escatológica da Igreja, a qual – sublinhou – não nasceu e não vive para suprir a ausência do seu Senhor, “desaparecido”, mas sim encontra a razão do seu ser e da sua missão na invisível presença de Jesus, que actua com a potência do seu Espírito”.

“Desde o dia da Ascensão, cada comunidade cristã avança no seu itinerário terreno em direcção ao cumprimento das promessas messiânicas, alimentada pela Palavra de Deus e nutrida com o Corpo e Sangue do seu Senhor.
É esta a condição da Igreja – recorda o Concílio Vaticano II – ao mesmo tempo que prossegue a sua peregrinação entre as perseguições do mundo e as consolações de Deus, anunciando a paixão e morte do Senhor, até que Ele venha”.

Dirigindo-se mais expressamente, neste contexto, à comunidade diocesana de Cassino, o Papa recordou que a solenidade da Ascensão nos exorta a “revigorar a nossa fé na presença real de Jesus: sem Ele nada podemos realizar de eficaz na nossa vida e no nosso apostolado”.

“Caros irmãos e irmãs, sentimos ecoar nesta nossa celebração o apelo de São Bento a manter o coração fixo em Cristo, nada antepondo a Ele. Isto não nos distrai, pelo contrário, leva-nos ainda mais a empenharmo-nos em construir uma sociedade onde a solidariedade se exprima com sinais concretos.”

Como? – interrogou-se o Papa. A espiritualidade beneditina – lembrou - propõe um programa evangélico sintetizado no lema Ora et labora et lege: oração, trabalho, cultura.
Antes de mais a oração, “a mais bela herança deixada por São Bento”. A oração – insistiu Bento XVI – é “a senda silenciosa que nos conduz directamente ao coração de Deus”, “o respiro da alma que nos restitui paz nas tempestades da vida”. Neste contexto, o Papa aludiu expressamente à chamada Lectio divina – que hoje em dia se tornou património comum de muitos. “Possa a escuta atenta da Palavra de Deus alimentar a nossa oração e tornar-vos profetas de verdade e de amor num empenho coral de evangelização e de promoção humana”.

Recordando depois que outro eixo da espiritualidade beneditina é o trabalho, observou:
“Humanizar o mundo do trabalho é típico da alma do monaquismo. É este também o esforço da vossa Comunidade que procura estar ao lado dos numerosos trabalhadores da grande indústria presente em Cassino e das empresas a ela ligadas. Sei como é crítica a situação de tantos operários.”

O Papa exprimiu “solidariedade a todos os que vivem uma preocupante situação de precariedade”, nomeadamente aos desempregados, e encorajou as autoridades e os empresários locais a procurarem “soluções válidas para a crise do desemprego”, salvaguardando assim o bem das famílias, que – sublinhou – tanto precisam de ser tuteladas.

Reservando uma última palavra ao mundo da cultura e da educação, Bento XVI evocou o célebre Arquivo e a Biblioteca do mosteiro de Montecassino, que “recolhem inumeráveis testemunhos do empenho de homens e mulheres que meditaram e procuraram como melhorar a vida espiritual e material do homem”. “Na vossa Abadia faz-se a experiência concreta do que significa quaerere Deum, isto é, o facto de a cultura europeia ter sido a busca de Deus e a disponibilidade para O escutar. E isto vale também para o nosso tempo”.
“No actual esforço cultural visando criar um novo humanismo”, o Papa congratulou-se com o facto de a comunidade diocesana local reservar a devida “atenção ao homem frágil, débil, às pessoas com deficiências e aos imigrados” – como o revela a inauguração, esta tarde, da “Casa da Caridade”, da diocese, onde (disse o Papa) “se constrói com os factos uma cultura atenta à vida”.