sábado, 27 de junho de 2009



Ao visitar o Seminário Maior Romano, em Fevereiro de 2007, Bento XVI respondeu a diversas perguntas dos seminaristas, esclarecendo suas dúvidas e estimulando-os a continuar sendo fiéis ao chamado do Senhor.
Santidade, em confidência de filhos confessamos-lhe a parcialidade da nossa resposta à chamada de Jesus. Como fazer para responder a uma vocação tão exigente como a de pastores do povo santo de Deus, sentindo constantemente a nossa fraqueza e incoerência?
É bom reconhecer a própria fraqueza, porque assim sabemos que precisamos da graça do Senhor. O Senhor conforta-nos. No colégio dos Apóstolos não havia só Judas, mas também os Apóstolos bons, e contudo Pedro caiu e muitas vezes o Senhor reprovava a lentidão, o fechamento do coração dos Apóstolos, a pouca fé que tinham. Portanto, isto mostra-nos que nenhum de nós é simplesmente digno deste grande sim, digno de celebrar "in persona Christi", de viver coerentemente neste contexto, de estar unido a Cristo na sua missão de sacerdote.O Senhor também nos concedeu, para nosso conforto, estas parábolas das redes com os peixes bons e maus, do campo onde cresce o grão mas também a erva daninha. Ele dá-nos a conhecer que veio precisamente para nos ajudar na nossa debilidade, que não veio, como Ele diz, para chamar os justos, os que já pretendem ser completamente justos, que não precisam da graça, os que rezam louvando- se a si mesmos, mas veio para chamar os que sabem que são imperfeitos, provocar os que sabem que precisam todos os dias do perdão do Senhor, da sua graça para ir em frente.Isto parece-me muito importante: reconhecer que precisamos de uma conversão permanente e que simplesmente nunca chegamos. Santo Agostinho, no momento da conversão, pensava que já tinha alcançado as alturas da vida com Deus, da beleza do sol que é a sua Palavra. Depois teve que compreender que também o caminho após a conversão permanece um caminho de conversão, um caminho no qual não faltam as grandes perspectivas, as alegrias, as luzes do Senhor, e também não faltam os vales obscuros, pelos quais devemos prosseguir com confiança apoiando-nos na bondade do Senhor.Por isso é importante também o sacramento da Reconciliação. Não é justo pensar que deveríamos viver dum modo que nunca se precisa de perdão. Aceitar a nossa fragilidade, mas permanecer a caminho, nunca se dar por vencido mas prosseguir e, mediante o sacramento da Reconciliação, converter-nos sempre de novo a um recomeçar e desta forma crescer, amadurecer para o Senhor, na nossa comunhão com Ele.Naturalmente, é importante também não se isolar, não pensar que se pode ir em frente sozinho. Temos muita necessidade da companhia de sacerdotes amigos, também de leigos amigos, que nos acompanham, nos ajudam. Para um sacerdote é muito importante, precisamente na paróquia, ver como o povo tem confiança nele e experimentar com a sua confiança também a sua generosidade em perdoar as suas debilidades. Os verdadeiros amigos desafiam-nos e ajudam-nos a ser fiéis neste caminho. Parece-me que esta atitude de paciência, de humildade nos possa ajudar a ser bons com os outros, a ter compreensão pelas debilidades dos outros, ajudá-los, também a eles, a perdoar como nós perdoamos.Penso que não sou indiscreto se digo que hoje recebi uma bonita carta do Cardeal Martini. Tinha-lhe expressado as felicitações pelo seu octagésimo aniversário. Somos coetâneos. Ao retribuir-me os votos, escreveu: agradeço sobretudo ao Senhor pelo dom da perseverança. Hoje, escreve ele também, o bem se faz bastante ad tempus, ad experimentum. O bem, segundo a sua essência, só se pode fazer de modo definitivo; mas para fazê-lo de modo definitivo, temos necessidade da graça da perseverança; rezo todos os dias, conclui ele, para que o Senhor me conceda esta graça. (...) O dom da perseverança dá-nos alegria, dá-nos a certeza de que somos amados pelo Senhor e que este amor nos ampara, nos ajuda e não nos deixa nas nossas debilidades.
Santidade, nos próximos meses, os meus companheiros e eu seremos ordenados padres. Passaremos da vida bem estruturada das regras do seminário, à situação muito mais complexa das nossas paróquias. Que conselhos nos pode dar para viver melhor o início do nosso ministério presbiteral?
Aqui no seminário há uma vida bem organizada. Diria, como primeiro ponto, que é importante também na vida de pastores da Igreja, na vida quotidiana do sacerdote, conservar na medida do possível uma certa ordem. Que nunca falte a Missa, um dia sem a Eucaristia é incompleto; e por isso já crescemos no Seminário com esta liturgia quotidiana. Parece- me muito importante que sintamos a necessidade de estar com o Senhor na Eucaristia, que não seja um dever profissional mas seja realmente um dever sentido interiormente, que nunca falte a Eucaristia. (...) Naturalmente devemos fazer tudo o que nos impõe a vida pastoral, a viada de um vice-pároco, de um pároco ou outras funções sacerdotais. Mas diria, nunca esqueçam destes pontos firmes, que são a Eucaristia e a Liturgia das Horas, de modo a manter uma certa ordem ao longo do dia para, como disse no início, não ter que inventar sempre de novo. "Serva ordinem et ordo servabit te", como aprendemos. É uma palavra verdadeira.Depois, é importante não perder a comunhão com os outros sacerdotes, com os companheiros de vida e não perder o contacto pessoal com a Palavra de Deus, a meditação. Como fazer? Eu tenho uma receita bastante simples: combinar a preparação da homilia dominical com a meditação pessoal, para fazer com que estas palavras não sejam dirigidas só aos outros, mas sejam realmente palavras ditas pelo Senhor a mim próprio, e amadurecidas num diálogo pessoal com o Senhor.Para que isto seja possível, o meu conselho é começar já na segundafeira, porque no sábado já é demasiado tarde, a preparação é apressada, e talvez falte a inspiração, porque temos em mente outras coisas. Por isso, diria, já na segunda-feira, ler simplesmente as leituras do próximo domingo que talvez pareçam muito inacessíveis. Um pouco como as pedras de Massa e Meriba, onde Moisés diz: "Mas como pode jorrar água destas pedras?".Deixamos ali essas leituras, deixamos que o coração as saboreie; no subconsciente as palavras trabalham e voltam um pouco todos os dias. Obviamente dever-se-ão também consultar livros, na medida do possível. E com este trabalho interior, dia após dia, vê-se como pouco a pouco amadurece uma resposta; esta palavra abre-se a pouco e pouco, torna-se palavra para mim. E dado que sou um contemporâneo, ela torna-se uma palavra também para os outros.
(Excertos do Encontro de Bento XVI com os seminaristas da Diocese de Roma, 17/2/2007)
(Revista Arautos do Evangelho, Maio/2007, n. 65, p. 6-7)