A Associação "Una Voce Helvetica" publicou, em março de 1982, sob a rubrica do Pe. RENÉ MARIE, um estudo, "Teologia da Missa". São excelentes essas páginas e julgo útil extrair delas alguns trechos[1].
A Igreja Católica "possui as verdadeiras fontes da graça sobrenatural que são os sete sacramentos. E todas essas fontes de graça correm do Calvário, onde o Cristo Redentor ofereceu seu sacrifício. O sacrifício do Calvário é assim a fonte única donde se derrama sobre o mundo toda a vida sobrenatural... . O sacrifício é o ato supremo da virtude de religião e essa virtude é a justiça que devemos a Deus. Ela consiste em reconhecer a grandeza eminente de Deus e a submissão do homem... ".
"O sacrifício é a expressão privilegiada da virtude da religião. O sacrifício, segundo a etimologia da palavra (sacrum facere), consiste em fazer o sagrado, diz-nos São Tomás de Aquino, isto é, separar para Deus".
"Desde a origem da humanidade vemos o homem oferecer a Deus sacrifícios e exprimir desse modo sua religião. Abel oferece as primícias de seus rebanhos...".
Relembremos, portanto, o resumo do ensinamento sobre o Sacrifício do Calvário: "Realizou-se no Calvário, em toda a sua plenitude, o sacrifício para a glória de Deus; há a vítima, a única digna de Deus: seu próprio filho. Existe o ofertante que não são nem os soldados romanos, nem os sacerdotes judeus, mas o próprio Cristo, o qual, simultaneamente sacerdote e vítima, se oferece a seu Pai e morre por sua própria vontade, após ter derramado todo o seu sangue, na imolação livremente consentida".
"Esse sacrifício é único e basta para render a Deus toda honra e glória e para obter para os homens a graça... . Esse sacrifício, fonte única de todo o bem superior, Deus o quis tornar presente em todas as gerações de homens que se sucederão ao longo de todos os séculos até o fim do mundo, pela instituição da Eucaristia, segundo o testemunho do Evangelho. O profeta Malaquias, o último do Antigo Testamento, já havia profetizado: ‘Eis que em todo o lugar se oferece a Deus uma oblação pura’ (Mal.1,11)".
"Que o sacrifício eucarístico seja a renovação do sacrifício da Cruz[2] e o modo de torná-lo presente, é a doutrina de fé definida pelo Concílio de Trento: A vítima é a mesma, o sacerdote ofertante é também o mesmo, só difere a maneira de oferecer".
"A vítima, com efeito, é sempre o
Cristo, sob as aparências do pão e do vinho. O sacerdote sacrificador também é
Cristo, que perpetua a oferenda voluntária de seu sacrifício".
"Os sacerdotes do Novo Testamento não são sucessores nem substitutos de Cristo, são simplesmente seus ministros ou seus instrumentos".
"Os sacerdotes do Novo Testamento não são sucessores nem substitutos de Cristo, são simplesmente seus ministros ou seus instrumentos".
"Convém esclarecer que
a Missa e o Sacrifício da Missa não constituem uma só e mesma coisa, mas o
Sacrifício se realiza na Missa. É a Igreja que institui os ritos da Missa para
magnificar o sacrifício do Senhor e para explicitar seu mistério e dispor, desse
modo, os espíritos aos sentimentos de adoração e de devoção".
Como se sabe, é na dupla Consagração que se realiza o Sacrifício: "O próprio Sacrifício da Missa encontra-se realizado essencialmente na dupla Consagração. É nesse rito, prescrito pelo Senhor, que se renova sacramentalmente o Sacrifício do Calvário. É somente nesse caso que o sacerdote age ‘na pessoa de Cristo’, em seu nome e em seu lugar".
“«O sacrifício do Calvário revivido sacramentalmente» é um parágrafo da brochura ‘Una Voce Helvetica’ que parece ser interessante aqui reproduzir”.
"O Concílio de Trento nos ensina que na Missa, como no Calvário, oferece-se a mesma vítima: o próprio Cristo; e é também o mesmo sacerdote que oferece; o próprio Cristo que se oferece pela redenção dos homens. Só a maneira de oferecer é diferente: no Calvário a imolação é sangrenta, na Missa a imolação reproduz-se sacramentalmente, isto é, por um sinal sacramental, a Deus reservado, que produz e realiza o que ele significa. A separação das oblatas é sinal sagrado que significa a morte de Cristo na Missa".
"No sacrifício de animais da Antiga Aliança, a separação do corpo e do sangue da vítima significa a morte da vítima. No sacrifício da Nova Aliança, a separação das oblatas significa sacramentalmente a morte da vítima: Cristo".
"É muito certo que Cristo morreu somente uma vez, mas, na Missa, sua imolação é significada e realizada sacramentalmente. Desse modo, a Missa é a renovação, a atualização no tempo, do Sacrifício da Cruz".
"Assim, cada vez que assistimos ao Sacrifício da Missa, subimos, em espírito, o Calvário, onde nos sentimos ao lado da Mãe das Dores e de São João. ‘Eu lá estava’ dizia Santo Agostinho. Este Sacrifício, continua a brochura, é satisfatório[3], oferecendo Cristo a Deus uma satisfação superabundante; ele é propiciatório[4], pois Cristo reconciliou o mundo com Deus; ele é impetratório[5], tendo Cristo suplicado ao Pai que concedesse aos homens as graças de santificação; ele é eucarístico, porque é homenagem perfeita de adoração, de louvor e de ações de graças a Deus".
"Mas, por que, então, a Missa?" indaga a brochura.
"É certíssimo - diz a publicação - que Cristo operou a Redenção do mundo em um ato único e que Ele morreu uma só vez... Por sua morte, logrou Cristo a salvação para todos os homens. É a doutrina da Igreja... . Cristo morreu, portanto, para todos. No entanto, isso não quer dizer que todos os homens sejam salvos. Ao contrário, Cristo nos disse que muitos irão ao fogo eterno".
"A Paixão de Cristo é causa universal de salvação e uma causa universal deve ser aplicada aos casos individuais. Ora, os méritos da Paixão de Cristo nos são aplicados precisamente pela renovação do Sacrifício da Missa".
"Eis um exemplo. Uma fonte é suficientemente abundante para satisfazer as necessidades de toda uma cidade; contudo, será preciso ainda captar essa fonte e transportar a água até a porta de cada habitante, senão, apesar da fonte, pode-se vir a morrer de sede... Assim, por sua Paixão, Cristo abriu a fonte de todo o bem espiritual. Todavia, isso não basta para que efetivamente participemos dessa fonte, é preciso que a aplicação de seus frutos se faça para cada um de nós. Essa é a obra do Sacrifício da Missa renovada sobre os nossos altares, (pois) a Missa é necessária para que os frutos da Paixão cheguem até nós."
“Evidentemente as diferentes orações da Missa não foram instituídas por Nosso Senhor. Os Apóstolos envolveram a Consagração e a Comunhão em preces e leituras e a Igreja, numa lenta elaboração, constituiu o Missal ou, mais exatamente, as diferentes Igrejas fizeram esse trabalho, donde a existência de missais diferentes uns dos outros, mas sempre com a mesma vontade de bem expor o mistério eucarístico e de preservá-lo das deformações heréticas”.
03 - SACRIFÍCIO DA MISSA: SACRIFÍCIO DA CRUZ CONTINUADO NO ALTAR
Jesus Cristo[6] é, Ele mesmo, o autor da Missa naquilo que ela tem de essencial, tendo a Igreja colocado os acessórios que são as cerimônias que acompanham o Sacrifício do Corpo e do Sangue de Nosso Senhor. O sacerdote, ao oferecer o Santo Sacrifício da Missa, apenas dá continuidade ao Sacrifício da Cruz, porque ele recebeu ordem formal de Jesus Cristo na véspera de sua morte, quando nosso divino Salvador deu, durante a Ceia, seu Corpo e seu Sangue aos seus Apóstolos dizendo-lhes: "FAZEI ISTO EM MEMÓRIA DE MIM[7]".
O rei David dá a Jesus Cristo, no salmo 109, o título de "Sacerdote eterno segundo a ordem de Melquisedeque", porque nosso divino Salvador vai utilizar o pão e o vinho no sacrifício (da Missa), como outrora o havia feito Melquisedeque. O rei profeta O chama Padre eterno, porque pai Ele será sempre e porque o sacrifício que Ele instituiu continuará a existir até o fim dos tempos graças ao sacerdócio católico!
O profeta Malaquias, no capítulo primeiro (1, 11), diz que "depois do nascer e até o pôr do sol, será oferecido (em todo lugar) um sacrifício puro e sem mancha à majestade do Altíssimo".
E o profeta Jeremias, no capítulo 33, 18, diz que “nunca se verá faltar os sacerdotes, nem os sacrifícios”.
Onde encontraremos o cumprimento de tais profecias? na Igreja Católica, e não junto aos protestantes uma vez que eles não têm nem sacerdócio, nem sacrifício.
A Lei de Moisés prescrevia quatro sacrifícios: o holocausto, o sacrifício eucarístico, o sacrifício impetratório e o sacrifício propiciatório.
As vítimas eram oferecidas em holocausto em reconhecimento ao soberano domínio de Deus sobre todas as criaturas.
Os sacrifícios eucarísticos eram oferecidos para agradecer a Deus quaisquer favores consideráveis (ou graças) que tivessem sido recebidos.
Oferecia-se um sacrifício impetratório para pedir a Deus qualquer graça importante.
O sacrifício propiciatório era oferecido para a expiação de qualquer pecado e de forma a tornar Deus propício.
Santo Agostinho (354-430), falando do Sacrifício da Missa no seu décimo sétimo Livro da Cidade de Deus, diz: "Este sacrifício foi estabelecido para tomar o lugar de todos os sacrifícios do Antigo Testamento".
Santo Iríneu (140-202) diz ainda: "Os Apóstolos receberam este sacrifício de Jesus Cristo e a Igreja o oferece hoje em dia em todos os lugares, conforme a profecia de Malaquias".
Celebrava-se a Missa há 600 anos, há 1200 anos, há 1900 anos, como a celebramos hoje em dia na Igreja Católica[8], porque a Igreja recebeu a missão de oferecer este divino sacrifício da boca do próprio Jesus Cristo.
Quando um costume é universalmente estabelecido na Igreja e não havendo um Papa, um Bispo ou algum Concílio que seja o seu autor, isto é uma prova evidente que foram os Apóstolos que nos ensinaram a praticá-lo.
O Sacrifício da Missa é um desses costumes.
SACRIFÍCIO PROPICIATÓRIO
O sacrifício da Missa é propiciatório para os vivos e para os mortos.
Para os vivos porque ele é oferecido a Deus para obter, para eles, o perdão dos pecados e a remissão das penas devidas por causa dos pecados... Este dogma da nossa fé pode ser provado pelas palavras de nossos Livros Santos: "Isto é meu sangue, que é derramado por muitos, para a remissão dos pecados" (Mt.26,28).
[...]
O Sacrifício da Missa é também propiciatório para os mortos, sendo oferecido para contribuir para a remissão das penas temporais que ainda tenham que ser pagas à justiça divina. Os Livros Santos nos dizem: "é um pensamento santo e salutar o de rezar pelos mortos a fim de que eles fiquem isentos de seus pecados". E - fazendo uma analogia - não se lê no décimo segundo capítulo do segundo Livro dos Macabeus, que Judas Macabeu, general de exército, após uma brilhante vitória obtida sobre os inimigos de sua nação, enviou doze mil dracmas de prata ao templo de Jerusalém para que fossem oferecidos sacrifícios pelas almas de seus soldados que haviam sucumbido no combate?
[...]
O Santo Sacrifício da Missa tem sido oferecido pelos mortos desde os primeiros tempos do cristianismo, como é fácil de se constatar pelo testemunho dos Santos Padres.
Tertuliano nos diz: "que uma mulher que não faz oferecer o Santo Sacrifício da Missa todos os anos por seu marido, no dia de seu falecimento, deve ser considerada como tendo se divorciado dele".
Desde as origens do cristianismo o Santo Sacrifício da Missa foi oferecido como ele ainda o é, em nossos dias, na Igreja de Jesus Cristo[9].
E esse Sacrifício sempre foi oferecido tanto pelos vivos como pelos mortos: um SACRIFÍCIO PROPICIATÓRIO, o que os protestantes não aceitam[10].
04 - A EXPLICITAÇÃO DA FÉ CATÓLICA: TRENTO
"Já eram decorridos 1500 anos que a Missa era celebrada como é dita hoje na Igreja Católica[11], quando o protestantismo rejeitou este dogma de nossa fé: a Missa é a oferenda do Corpo e do Sangue de Jesus Cristo feita a Deus pelo sacerdote".
Tendo "Lutero, e outros", negado "certo número de verdades, o Concílio de Trento definiu, de maneira precisa, a fé católica".
"O Concílio de Trento afirma a presença real e substancial de Cristo sob as aparências do pão e do vinho, e o fato de que a Missa é verdadeiramente um sacrifício verdadeiro, em substância, o Sacrifício da Cruz, isto é, um sacrifício propiciatório pela remissão dos pecados, ao mesmo tempo que (é) um sacrifício de louvor e de ação de graças. Ademais, tendo recebido o sacramento da ordem, somente o sacerdote tem o poder de consagrar".
Mas tal doutrina, afirmada, ou melhor, reafirmada no Concílio de Trento, não é uma coisa nova, nascida daquele Concílio, no século XVI, pois o que aquele Concílio fez foi tornar explícitas as verdades de fé, relativas à Missa e ao Sacerdócio, que foram professadas desde os primeiros tempos da Igreja.
De fato, as verdades negadas por Lutero faziam parte, na época daquele Concílio, do "Magistério da Igreja exercido de maneira tácita", ou seja, aquele que corresponde a "tudo o que foi crido desde o tempo dos Apóstolos, ... tudo o que está contido na Sagrada Escritura e tudo o que faz parte da Tradição".
Porém, em decorrência das heresias protestantes, foi necessário passar ao ensinamento explícito daquilo que antes a Igreja tinha se limitado a propor tacitamente, ou seja, foi necessário passar do Magistério Tácito ao Magistério Explícito.
Foi o que fez o Concílio de Trento.
Além disso, "como os erros de Lutero se insinuassem, quer no espírito de clérigos, quer no de fiéis, quer em certos missais, desejou aquele Concílio um estudo dos diferentes missais e a elaboração de um Missal que fechasse a porta às heresias. Este trabalho foi realizado pelo Papa São Pio V".
E a Missa restaurada por São Pio V e por ele canonizada expressa "claramente estas realidades: SACRIFÍCIO, PRESENÇA REAL da Vítima e SACERDÓCIO DOS PADRES", exprimindo "de maneira precisa a fé católica"
Notas:
[1] - Palavras do Padre Des Graviers. Toda esta parte reproduz trecho de artigo deste Padre intitulado: “PARECER SOBRE A ‘RESTAURAÇÃO’ DA MISSA APÓS O VATICANO II.
[2] - A doutrina sobre o “santíssimo Sacrifício da Missa” tal como “ensina, declara e determina” o Concílio de Trento, “para que se mantenha integra na Igreja Católica a antiga fé e doutrina do grande mistério eucarístico”, foi tornada explícita na Sessão XXII, de 17-09-1562.
[3] - Em outras obras consta “culto de latria”, ou seja, de adoração à Deus.
[4] - PROPICIAÇÃO: ação de tornar Deus propício.
[5] - IMPETRAÇÃO: ação de obter de Deus as graças e as bençãos divinas.
[6] - Transcrição de trecho de conferência do Monsenhor Guay.
[7] - O destaque é meu.
[8] - Em 1907, Monsenhor Guay fala da Missa que, vinda dos primeiros tempos do Cristianismo foi aprimorada por santos Papas — São Dâmazo, São Leão, São Gelásio, São Gregório — e restaurada por São Pio V.
D
[9] - Até aqui transcrição de trechos da conferência sobre “A Igreja e os Sacramentos”, feita por Monsenhor Ch. Guay, em 1907.
[10] - Ver, mais adiante, o artigo 05.
[11] - Estamos falando da “Missa de Sempre”, e, evidentemente, antes do Vaticano II.
Como se sabe, é na dupla Consagração que se realiza o Sacrifício: "O próprio Sacrifício da Missa encontra-se realizado essencialmente na dupla Consagração. É nesse rito, prescrito pelo Senhor, que se renova sacramentalmente o Sacrifício do Calvário. É somente nesse caso que o sacerdote age ‘na pessoa de Cristo’, em seu nome e em seu lugar".
“«O sacrifício do Calvário revivido sacramentalmente» é um parágrafo da brochura ‘Una Voce Helvetica’ que parece ser interessante aqui reproduzir”.
"O Concílio de Trento nos ensina que na Missa, como no Calvário, oferece-se a mesma vítima: o próprio Cristo; e é também o mesmo sacerdote que oferece; o próprio Cristo que se oferece pela redenção dos homens. Só a maneira de oferecer é diferente: no Calvário a imolação é sangrenta, na Missa a imolação reproduz-se sacramentalmente, isto é, por um sinal sacramental, a Deus reservado, que produz e realiza o que ele significa. A separação das oblatas é sinal sagrado que significa a morte de Cristo na Missa".
"No sacrifício de animais da Antiga Aliança, a separação do corpo e do sangue da vítima significa a morte da vítima. No sacrifício da Nova Aliança, a separação das oblatas significa sacramentalmente a morte da vítima: Cristo".
"É muito certo que Cristo morreu somente uma vez, mas, na Missa, sua imolação é significada e realizada sacramentalmente. Desse modo, a Missa é a renovação, a atualização no tempo, do Sacrifício da Cruz".
"Assim, cada vez que assistimos ao Sacrifício da Missa, subimos, em espírito, o Calvário, onde nos sentimos ao lado da Mãe das Dores e de São João. ‘Eu lá estava’ dizia Santo Agostinho. Este Sacrifício, continua a brochura, é satisfatório[3], oferecendo Cristo a Deus uma satisfação superabundante; ele é propiciatório[4], pois Cristo reconciliou o mundo com Deus; ele é impetratório[5], tendo Cristo suplicado ao Pai que concedesse aos homens as graças de santificação; ele é eucarístico, porque é homenagem perfeita de adoração, de louvor e de ações de graças a Deus".
"Mas, por que, então, a Missa?" indaga a brochura.
"É certíssimo - diz a publicação - que Cristo operou a Redenção do mundo em um ato único e que Ele morreu uma só vez... Por sua morte, logrou Cristo a salvação para todos os homens. É a doutrina da Igreja... . Cristo morreu, portanto, para todos. No entanto, isso não quer dizer que todos os homens sejam salvos. Ao contrário, Cristo nos disse que muitos irão ao fogo eterno".
"A Paixão de Cristo é causa universal de salvação e uma causa universal deve ser aplicada aos casos individuais. Ora, os méritos da Paixão de Cristo nos são aplicados precisamente pela renovação do Sacrifício da Missa".
"Eis um exemplo. Uma fonte é suficientemente abundante para satisfazer as necessidades de toda uma cidade; contudo, será preciso ainda captar essa fonte e transportar a água até a porta de cada habitante, senão, apesar da fonte, pode-se vir a morrer de sede... Assim, por sua Paixão, Cristo abriu a fonte de todo o bem espiritual. Todavia, isso não basta para que efetivamente participemos dessa fonte, é preciso que a aplicação de seus frutos se faça para cada um de nós. Essa é a obra do Sacrifício da Missa renovada sobre os nossos altares, (pois) a Missa é necessária para que os frutos da Paixão cheguem até nós."
“Evidentemente as diferentes orações da Missa não foram instituídas por Nosso Senhor. Os Apóstolos envolveram a Consagração e a Comunhão em preces e leituras e a Igreja, numa lenta elaboração, constituiu o Missal ou, mais exatamente, as diferentes Igrejas fizeram esse trabalho, donde a existência de missais diferentes uns dos outros, mas sempre com a mesma vontade de bem expor o mistério eucarístico e de preservá-lo das deformações heréticas”.
03 - SACRIFÍCIO DA MISSA: SACRIFÍCIO DA CRUZ CONTINUADO NO ALTAR
Jesus Cristo[6] é, Ele mesmo, o autor da Missa naquilo que ela tem de essencial, tendo a Igreja colocado os acessórios que são as cerimônias que acompanham o Sacrifício do Corpo e do Sangue de Nosso Senhor. O sacerdote, ao oferecer o Santo Sacrifício da Missa, apenas dá continuidade ao Sacrifício da Cruz, porque ele recebeu ordem formal de Jesus Cristo na véspera de sua morte, quando nosso divino Salvador deu, durante a Ceia, seu Corpo e seu Sangue aos seus Apóstolos dizendo-lhes: "FAZEI ISTO EM MEMÓRIA DE MIM[7]".
O rei David dá a Jesus Cristo, no salmo 109, o título de "Sacerdote eterno segundo a ordem de Melquisedeque", porque nosso divino Salvador vai utilizar o pão e o vinho no sacrifício (da Missa), como outrora o havia feito Melquisedeque. O rei profeta O chama Padre eterno, porque pai Ele será sempre e porque o sacrifício que Ele instituiu continuará a existir até o fim dos tempos graças ao sacerdócio católico!
O profeta Malaquias, no capítulo primeiro (1, 11), diz que "depois do nascer e até o pôr do sol, será oferecido (em todo lugar) um sacrifício puro e sem mancha à majestade do Altíssimo".
E o profeta Jeremias, no capítulo 33, 18, diz que “nunca se verá faltar os sacerdotes, nem os sacrifícios”.
Onde encontraremos o cumprimento de tais profecias? na Igreja Católica, e não junto aos protestantes uma vez que eles não têm nem sacerdócio, nem sacrifício.
A Lei de Moisés prescrevia quatro sacrifícios: o holocausto, o sacrifício eucarístico, o sacrifício impetratório e o sacrifício propiciatório.
As vítimas eram oferecidas em holocausto em reconhecimento ao soberano domínio de Deus sobre todas as criaturas.
Os sacrifícios eucarísticos eram oferecidos para agradecer a Deus quaisquer favores consideráveis (ou graças) que tivessem sido recebidos.
Oferecia-se um sacrifício impetratório para pedir a Deus qualquer graça importante.
O sacrifício propiciatório era oferecido para a expiação de qualquer pecado e de forma a tornar Deus propício.
Santo Agostinho (354-430), falando do Sacrifício da Missa no seu décimo sétimo Livro da Cidade de Deus, diz: "Este sacrifício foi estabelecido para tomar o lugar de todos os sacrifícios do Antigo Testamento".
Santo Iríneu (140-202) diz ainda: "Os Apóstolos receberam este sacrifício de Jesus Cristo e a Igreja o oferece hoje em dia em todos os lugares, conforme a profecia de Malaquias".
Celebrava-se a Missa há 600 anos, há 1200 anos, há 1900 anos, como a celebramos hoje em dia na Igreja Católica[8], porque a Igreja recebeu a missão de oferecer este divino sacrifício da boca do próprio Jesus Cristo.
Quando um costume é universalmente estabelecido na Igreja e não havendo um Papa, um Bispo ou algum Concílio que seja o seu autor, isto é uma prova evidente que foram os Apóstolos que nos ensinaram a praticá-lo.
O Sacrifício da Missa é um desses costumes.
SACRIFÍCIO PROPICIATÓRIO
O sacrifício da Missa é propiciatório para os vivos e para os mortos.
Para os vivos porque ele é oferecido a Deus para obter, para eles, o perdão dos pecados e a remissão das penas devidas por causa dos pecados... Este dogma da nossa fé pode ser provado pelas palavras de nossos Livros Santos: "Isto é meu sangue, que é derramado por muitos, para a remissão dos pecados" (Mt.26,28).
[...]
O Sacrifício da Missa é também propiciatório para os mortos, sendo oferecido para contribuir para a remissão das penas temporais que ainda tenham que ser pagas à justiça divina. Os Livros Santos nos dizem: "é um pensamento santo e salutar o de rezar pelos mortos a fim de que eles fiquem isentos de seus pecados". E - fazendo uma analogia - não se lê no décimo segundo capítulo do segundo Livro dos Macabeus, que Judas Macabeu, general de exército, após uma brilhante vitória obtida sobre os inimigos de sua nação, enviou doze mil dracmas de prata ao templo de Jerusalém para que fossem oferecidos sacrifícios pelas almas de seus soldados que haviam sucumbido no combate?
[...]
O Santo Sacrifício da Missa tem sido oferecido pelos mortos desde os primeiros tempos do cristianismo, como é fácil de se constatar pelo testemunho dos Santos Padres.
Tertuliano nos diz: "que uma mulher que não faz oferecer o Santo Sacrifício da Missa todos os anos por seu marido, no dia de seu falecimento, deve ser considerada como tendo se divorciado dele".
Desde as origens do cristianismo o Santo Sacrifício da Missa foi oferecido como ele ainda o é, em nossos dias, na Igreja de Jesus Cristo[9].
E esse Sacrifício sempre foi oferecido tanto pelos vivos como pelos mortos: um SACRIFÍCIO PROPICIATÓRIO, o que os protestantes não aceitam[10].
04 - A EXPLICITAÇÃO DA FÉ CATÓLICA: TRENTO
"Já eram decorridos 1500 anos que a Missa era celebrada como é dita hoje na Igreja Católica[11], quando o protestantismo rejeitou este dogma de nossa fé: a Missa é a oferenda do Corpo e do Sangue de Jesus Cristo feita a Deus pelo sacerdote".
Tendo "Lutero, e outros", negado "certo número de verdades, o Concílio de Trento definiu, de maneira precisa, a fé católica".
"O Concílio de Trento afirma a presença real e substancial de Cristo sob as aparências do pão e do vinho, e o fato de que a Missa é verdadeiramente um sacrifício verdadeiro, em substância, o Sacrifício da Cruz, isto é, um sacrifício propiciatório pela remissão dos pecados, ao mesmo tempo que (é) um sacrifício de louvor e de ação de graças. Ademais, tendo recebido o sacramento da ordem, somente o sacerdote tem o poder de consagrar".
Mas tal doutrina, afirmada, ou melhor, reafirmada no Concílio de Trento, não é uma coisa nova, nascida daquele Concílio, no século XVI, pois o que aquele Concílio fez foi tornar explícitas as verdades de fé, relativas à Missa e ao Sacerdócio, que foram professadas desde os primeiros tempos da Igreja.
De fato, as verdades negadas por Lutero faziam parte, na época daquele Concílio, do "Magistério da Igreja exercido de maneira tácita", ou seja, aquele que corresponde a "tudo o que foi crido desde o tempo dos Apóstolos, ... tudo o que está contido na Sagrada Escritura e tudo o que faz parte da Tradição".
Porém, em decorrência das heresias protestantes, foi necessário passar ao ensinamento explícito daquilo que antes a Igreja tinha se limitado a propor tacitamente, ou seja, foi necessário passar do Magistério Tácito ao Magistério Explícito.
Foi o que fez o Concílio de Trento.
Além disso, "como os erros de Lutero se insinuassem, quer no espírito de clérigos, quer no de fiéis, quer em certos missais, desejou aquele Concílio um estudo dos diferentes missais e a elaboração de um Missal que fechasse a porta às heresias. Este trabalho foi realizado pelo Papa São Pio V".
E a Missa restaurada por São Pio V e por ele canonizada expressa "claramente estas realidades: SACRIFÍCIO, PRESENÇA REAL da Vítima e SACERDÓCIO DOS PADRES", exprimindo "de maneira precisa a fé católica"
Notas:
[1] - Palavras do Padre Des Graviers. Toda esta parte reproduz trecho de artigo deste Padre intitulado: “PARECER SOBRE A ‘RESTAURAÇÃO’ DA MISSA APÓS O VATICANO II.
[2] - A doutrina sobre o “santíssimo Sacrifício da Missa” tal como “ensina, declara e determina” o Concílio de Trento, “para que se mantenha integra na Igreja Católica a antiga fé e doutrina do grande mistério eucarístico”, foi tornada explícita na Sessão XXII, de 17-09-1562.
[3] - Em outras obras consta “culto de latria”, ou seja, de adoração à Deus.
[4] - PROPICIAÇÃO: ação de tornar Deus propício.
[5] - IMPETRAÇÃO: ação de obter de Deus as graças e as bençãos divinas.
[6] - Transcrição de trecho de conferência do Monsenhor Guay.
[7] - O destaque é meu.
[8] - Em 1907, Monsenhor Guay fala da Missa que, vinda dos primeiros tempos do Cristianismo foi aprimorada por santos Papas — São Dâmazo, São Leão, São Gelásio, São Gregório — e restaurada por São Pio V.
D
[9] - Até aqui transcrição de trechos da conferência sobre “A Igreja e os Sacramentos”, feita por Monsenhor Ch. Guay, em 1907.
[10] - Ver, mais adiante, o artigo 05.
[11] - Estamos falando da “Missa de Sempre”, e, evidentemente, antes do Vaticano II.