Iniciaram-se hoje, na Pontifícia Universidade São Tomás de Aquino, mais conhecida como Angelicum, os trabalhos abertos a todo público do “III Congresso Summorum Pontificum: uma esperança para toda a Igreja” (“III Convegno Summorum Pontificum: una speranza per tutta la Chiesa”) para o qual fomos convidados pela associação Giovani e Tradizione.
A missa de abertura, celebrada pelo Revdo. Padre Vicenzo Nuara, OP, presidente honorário da associação italiana Giovani e Tradizione e fundador da Amicizia Sacerdotale Summorum Pontificum, organizadoras do evento, realizou-se na Igreja de São Domingos, da mesma universidade, e contou com o serviço litúrgico e musical dos Franciscanos da Imaculada, jovem congregação que, a partir do Motu Proprio, aderiu à liturgia tridentina e que possui hoje cerca de setecentos membros em seus dois ramos, masculino e feminino. A adesão à liturgia tradicional tem trazido a essa congregação um número sempre crescente de vocações.
O público presente era numeroso, sendo notável a presença de grande quantidade de sacerdotes e religiosos, da Itália e do exterior, bem como as prestigiosas presenças de dois bispos – S. Excia. Revma. Dom Marc Aillet, bispo de Bayonne, e S. Excia. Revma. Dom Athanasius Schneider, bispo auxiliar de Astana – e de três cardeais – S. Ema. Revma. Cardeal Antonio Cañizares Llovera, prefeito da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, S. Em. Revma. Cardeal Kurt Koch, presidente do Pontifício Conselho para a promoção da Unidade dos cristãos, e S. Ema. Revma. Cardeal Castrillón Hoyos, presente ao fim dos trabalhos e à benção do Santíssimo, com a qual se finalizou o dia na Igreja de São Domingos.
Após a abertura oficial – pronunciada pelo Padre Nuara, em que agradeceu ao Santo Padre Bento XVI a promulgação do Motu Proprio Summorum Pontificum e também afirmou que mesmo os fiéis que seguem a forma ordinária do Rito Romano, ou seja, a reforma do Papa Paulo VI, têm o direito de conhecer a forma extraordinária desse Rito e que é dever dos padres e dos bispos fazê-lo conhecer a todos os fiéis, mesmo àqueles que não o peçam. E, por isso, o Usus Antiquor deveria existir em todas as paróquias e não apenas onde fosse pedida por alguns fiéis –, tomou a palavra S. Ema. Revma. Cardeal Cañizares Llovera, que tratou da importância da liturgia na vida da Igreja.
Segundo o Cardeal, ardoroso defensor da hermenêutica da continuidade, propugnada por Bento XVI, o pós-concílio foi marcado por uma concepção do homem como criador, concepção essa que não combina com uma liturgia inteiramente voltada para Deus, como deve ser, segundo ele, toda a liturgia católica. E, portanto, para uma verdadeira reforma litúrgica, é necessário renovar o conhecimento do sentido da liturgia, tanto nos sacerdotes quanto nos fiéis, colocando a adoração a Deus, o sacrifício de Cristo, no centro de toda a ação litúrgica.
Falou a seguir Dom Marc Aillet, bispo de Bayonne, numa conferência intitulada Spirito della liturgia, liturgia dello Spirito, em que defendeu, seguindo a atmosfera predominante, embora não exclusiva, do Congresso, um “clima paz e de reconciliação litúrgica”, afirmando que não pretendia, com suas observações sobre as qualidades da forma extraordinária, pôr “em discussão o missal de 1969”, pois que não pode haver, segundo ele, forma litúrgica que não tenha elementos contingentes. Sua Excia. ressaltou particularmente o fato de que o ofertório do Usus Antiquor manifesta de forma excelente o caráter propiciatório do sacrifício de Cristo, o que não acontece no Novus Ordo. Também procurou ressaltar alguns pontos positivos, segundo ele, da reforma litúrgica e que poderiam enriquecer o missal de 1962, como, por exemplo, as leituras mais variadas da Sagrada Escritura.
A terceira palestra foi pronunciada pelo Cardeal Kurt Koch que, de forma surpreendente, tratou do Usus Antiquor como uma “ponte ecumênica”, chegando a afirmar que hoje a Igreja Católica é a única Igreja cristã que não tem seu culto voltado para o Senhor, de onde deduzimos que ele apenas chamou de “igrejas”, separadas da católica, as cismáticas orientais, e não as diversas seitas protestantes, no espírito, aliás, da Declaração Dominus Iesus, do Papa João Paulo II.
Os trabalhos da manhã foram concluídos com a excelente e muito aplaudida conferência de Dom Athanasius Schneider, conferencista nas três edições do Convegno. Sob o título de As Ordens menores e o santo serviço do Altar, ele tratou de maneira erudita e profundamente teológica da importância da conservação das ordens menores na Igreja por, pelo menos, mil e setecentos anos, ressaltando sua imensa importância doutrinária no que tange ao sacerdócio católico, para concluir pedindo um novo Motu Proprio que as restabeleça, pois considera essa medida uma necessidade lógica da promulgação do Motu Proprio Summorum Pontificum e, portanto, “um grande bem para a Igreja”.
Após a recitação do terço, iniciaram-se as palestras da tarde com a conferência de Mons. Guido Pozzo, secretário da Pontifícia Comissão Ecclesia Dei, que devia falar sobre o tema O Motu Proprio Summorum Pontificum, balanço e perspectivas, mas que, de fato, concentrou seu pronunciamento sobre a instrução Universae Ecclesiae, promulgada ontem. Notável e curioso foi o fato de que, ao examinar detalhadamente os pontos desse documento, Mons. Pozzo saltou, em sua análise, do item 18 para o item 20, não mencionando, nem fazendo qualquer comentário sobre o delicado ponto de número 19, que define as condições sob as quais deve se encontrar o coetus fidelium para que lhe seja concedida a missa na forma extraordinária, embora tenha ressaltado, desde o início de sua palestra, que, segundo a mens da Comissão Ecclesia Dei, não deve haver nenhum espírito que oponha uma forma à outra. Tivemos ocasião de tratar, em particular, sobre o significado desse delicado ponto com alguns palestrantes do congresso e pudemos verificar que há nuances em sua interpretação.
Em seguida tomou a palavra o Padre Nicola Bux, do Instituto Teológico de Bari, autor do livro recém publicado Como ir à Missa e não perder a fé. Efetuando uma reflexão teológica sobre o sacramento da ordem – O sacramento da Ordem sacra no Pontifical Romano (editio typica de 1961-62) –, ele ressaltou que o culto devido a Deus é aquele que Deus mesmo estabeleceu e apresentou São João Batista como “protótipo do ministro sagrado”, que deve diminuir para que Cristo cresça, insistindo em que o ministro sacro não é o protagonista da liturgia, mas o próprio Cristo. Afirmou também, referindo-se aos escândalos de pedofilia, que onde há abusos litúrgicos, há sérios desvios morais.
A palestra seguinte – A origem apostólico-patrística da “Missa Tridentina” – foi preparada pela irmã Francisca da Imaculada, do ramo contemplativo das Franciscanas da Imaculada, que vivem em clausura. E, por isso, a conferência foi lida por uma irmã do ramo ativo da mesma congregação. Foi a única palestra a ser aplaudida de pé, pois a religiosa fez uma corajosa e erudita demonstração de que o chamado rito tridentino de nenhuma forma foi uma criação litúrgica efetuada em moldes semelhantes à do Papa Paulo VI, mas apenas uma purificação de um rito já então estabelecido há mais de mil anos pelo Papa São Gregório Magno. Citou, além disso, o Breve Exame Crítico do Novus Ordo, de autoria dos Cardeais Ottaviani e Bacci, lembrando a famosa afirmação de que o novo rito se afasta de forma impressionante da teologia católica da missa. Solicitamos à irmã leitora o texto da interessantíssima palestra, que ela prometeu enviar-nos e que pretendemos traduzir e publicar no site Montfort.
Fechou o Congresso o Prof. Roberto De Matei, da Univerdade Europeia de Roma, que dissertou sobre o latim como língua universal da Igreja Católica, propugnando o incremento necessário do estudo do latim e de sua difusão como língua litúrgica e de governo para uma verdadeira e profícua reforma da Igreja.
O dia do Congresso conclui-se com o canto do Te Deum e a benção do Santíssimo Sacramento, oficiada pelo Cardeal Castrillón Hoyos, na feliz expectativa da Missa Pontifical de encerramento, a ser celebrada amanhã pelo Cardeal Walter Brandmüller no Altar da Confissão na Basílica de São Pedro, de onde o rito gregoriano se encontrava banido há mais de quarenta anos. Laus Deo Virginique Matri!
Ivone Fedeli e Guilherme Chenta
Roma, 14 de maio de 2011
Roma, 14 de maio de 2011