“É bastante insignificante ser popular ou impopular. Para todo membro do clero, o seu primeiro interesse deveria ser o de ser popular aos olhos de Deus e não aos olhos do mundo de hoje ou dos poderosos. Jesus alertou: ‘Ai de vós, quando vos louvarem os homens.’ Popularidade é algo falso… Os grandes santos da Igreja, como, por exemplo, Thomas More e João Fisher, rejeitaram a popularidade… aqueles que hoje em dia estão preocupados com a popularidade dos meios de comunicação e a opinião pública… serão lembrados como covardes e não como heróis da Fé.”
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Durante uma viagem à Inglaterra, o bispo nascido na União Soviética diz que a Igreja hoje em dia está experimentando uma ‘confusão tremenda’.
Por Sarah Atkinson – Catholic Herald | Tradução: Fratres in Unum.com - Os liberais, colaborando com o “novo paganismo”, estão levando a Igreja Católica em direção a uma divisão, de acordo com Dom Athanasius Schneider, o especialista litúrgico que está travando uma luta contra os “abusos” na Igreja.
Os problemas são tão sérios que Dom Schneider disse, em uma entrevista na semana passada, que esta é a quarta grande crise na história da Igreja, comparável à heresia ariana do século IV, na qual grande parte da hierarquia da Igreja estava envolvida.
Se você não ouviu sobre o bispo nascido na União Soviética, você o fará. O clérigo sincero e erudito é bispo auxiliar da distante arquidiocese de Santa Maria, em Astana, no Cazaquistão. Mas este mês ele recebeu as boas-vindas de um astro de rock de fiéis de todo o país em sua viagem à Inglaterra e abraçou o ciberespaço para transmitir uma defesa incisiva e tradicional da Igreja. “Graças a Deus, existe a internet,” ele disse.
As opiniões dele não são populares para todo mundo, especialmente para alguns de seus confrades liberais, ou, diz ele, com os meios de comunicação predominantes do mundo secular. Porém, o seu público diz outra história.
Dom Schneider é mais conhecido por defender que a Santa Comunhão deve ser recebida sobre a língua e de joelhos, o que ele insiste ser a maneira mais eficiente para promover o respeito ao Sacramento e impedir abuso das Hóstias Sagradas. O bispo de 53 anos de idade também convocou um esclarecimento (um novo Syllabus de Erros), direcionado ao clero, para pôr um fim ao vale tudo litúrgico e doutrinal em uma série de questões relacionadas ao “espírito do Vaticano II”.
Em sua entrevista, Dom Shneider disse que o tratamento “banal” e casual do Santíssimo Sacramento é parte de uma crise maior na Igreja em que alguns leigos e clérigos, incluindo alguns em cargos de autoridade, estão tomando partido do lado da sociedade secular. O cerne dos problemas, ele acredita, está na introdução furtiva de uma agenda centrada no homem, ao passo que em algumas igrejas Deus, presente no sacrário, de fato está fisicamente colocado em um canto, enquanto o sacerdote ocupa o centro. Dom Schneider argumentou que essa situação agora está chegando a um ponto crítico. “Eu diria, estamos na quarta maior crise [da Igreja], em uma tremenda confusão sobre doutrina e liturgia. Já estamos nessa situação há 50 anos.”
Até quando ela perdurará? “Talvez Deus será misericordioso para conosco em 20 ou 30 anos.”
No outono [europeu], o sínodo dos bispos se reunirá em sessão extraordinária para discutir a família, à luz do questionário que ao Papa Francisco convidou os fiéis para preencher, dando suas opiniões sobre o matrimônio e a sexualidade. Crescem as expectativas de que as regras serão relaxadas em uma gama de assuntos sexuais e em termos de pessoas divorciadas recebendo a Comunhão como sinal de “misericórdia” da Igreja.
Essas opiniões, de acordo com Dom Bishop Schneider, revelam a profundidade do problema. “Penso que essa questão da recepção da Sagrada Comunhão por recasados explodirá e revelará a crise real na Igreja. A crise real da Igreja é antropocentrismo e o esquecimento do cristocentrismo…
“Esse é o mal mais profundo: o homem ou o clero se colocando no centro quando estão celebrando a liturgia e quando alteram a verdade revelada de Deus, por exemplo, com relação ao sexto mandamento e a sexualidade humana.”
Embora ele diga que as conversas de mudança parta principalmente dos “meios de comunicação anticristãos”, ele vê clérigos e católicos leigos que “colaboram” com o que ele chama de novo paganismo. Dom Schneider é particularmente crítico quanto à ideia de que essas mudanças devem ser feitas para usar de misericórdia com aqueles atualmente banidos da recepção dos Sacramentos. “[Isso é] um tipo de sofisma,” ele disse. “Isso não é misericórdia, isso é cruel.”
Ele deu a entender que este era “um falso conceito de misericórdia”, dizendo: “Ela se compara a um médico que dá açúcar a um paciente [diabético], embora ele saiba que ela irá matá-lo.”
O bispo acredita que há paralelos claros com as grandes crises do passado, quando padres em posição de liderança eram cúmplices com as heresias. Na heresia ariana, ele disse, contando nos dedos da mão, somente um punhado da hierarquia resistiu. “Nós [cristãos] somos uma minoria. Estamos rodeados de um mundo pagão muito cruel. A tentação e desafio de hoje em dia podem ser comparados aos primeiros séculos.”
Ele acrescentou: “Infelizmente havia… membros do clero e até mesmo bispos que colocavam grãos de incenso em frente da estátua do imperador ou de um ídolo pagão ou que entregavam os livros da Sagrada Escritura para serem queimados. Naqueles tempos, esses cristãos e clérigos colaboracionistas eram chamados de thurificati ou traditores.”
E hoje em dia, prosseguiu ele, também temos aqueles que colaboram, são os “traidores da Fé”.
O Papa Francisco é visto como à frente de uma postura liberal vinda de Roma. Porém, Dom Schneider diz: “Graças a Deus, o Papa Francisco não se expressou dessa maneira como os meios de comunicação esperam dele. Até agora, em suas homilias oficiais [ndr: estaria Sua Excelência fazendo uma sutil distinção entre homilias oficiais e aquelas da Casa Santa Marta?...], ele proclamou a belíssima doutrina católica. Espero que ele continue ensinando a doutrina católica de maneira muito clara.”
O bispo disse que espera que “a maioria dos bispos ainda tenham o espírito católico e fé o bastante para rejeitar a proposta e não aceitá-la”.
Todavia, ele pode prever uma divisão se aproximando, por fim, levando a uma renovação da Igreja em linhas tradicionais. Mas, ele acredita que isso não acontecerá antes da crise ter mergulhado a Igreja ainda mais em desordem. Por fim, ele acha que o sistema clerical “antropocêntrico” [centrado no homem] irá desmoronar. “Esse edifício clerical liberal irá desabar porque eles não têm raízes e não têm frutos,” ele disse.
Na confusão, Dom Schneider receia que os católicos tradicionais, por um tempo, serão perseguidos e discriminados novamente, mesmo sob as ordens daqueles que têm “poder nas estruturas exteriores da Igreja”. Porém, ele acredita que as pessoas envolvidas na “heresia não prevalecerão novamente contra a Igreja”. E, na esperança, o bispo disse: “O Supremo Magistério certamente emitirá uma declaração doutrinal inequívoca, rejeitando qualquer colaboração com as ideias neo-pagãs.”
Nessa altura, Dom Schneider crê que os thurificati et traditores modernos deixarão a Igreja. “Posso assumir que essa separação irá afetar cada nível dos católicos: leigos e até mesmo o alto clero,” ele disse.
Provavelmente, esses comentários não darão popularidade a Dom Schneider em alguns círculos, mas ele argumenta: “É bastante insignificante ser popular ou impopular. Para todo membro do clero, o seu primeiro interesse deveria ser o de ser popular aos olhos de Deus e não aos olhos do mundo de hoje ou dos poderosos. Jesus alertou: ‘Ai de vós, quando vos louvarem os homens.’”
Ele acrescentou: “Popularidade é algo falso… Os grandes santos da Igreja, como, por exemplo, Thomas More e João Fisher, rejeitaram a popularidade… aqueles que hoje em dia estão preocupados com a popularidade dos meios de comunicação e a opinião pública… serão lembrados como covardes e não como heróis da Fé.”
Dom Schneider observa pesarosamente que há muitos cujos pontos de vista coincidem com os pagãos que “se declaram católicos e até mesmo fiéis ao Papa”, ao passo que “aqueles que são fiéis à fé católica ou aqueles que promovem a glória de Cristo na liturgia” são rotulados de extremistas.
Esses críticos podem afirmar que os receios de Dom Schneider sobre a Sagrada Comunhão é como se preocupar sobre o sexo dos anjos. Mas o bispo insiste que o tratamento da Eucaristia está no próprio coração da crise. “A Eucaristia está no coração da Igreja,” ele disse. “Quando o coração está fraco, todo o corpo está fraco.”
Ele argumentou que receber a Comunhão nas mãos “contribui gradualmente para a perda da fé católica na Presença Real e na transubstanciação”.
Dom Schneider rejeitou também a ideia de que a preocupação pela liturgia é menos importante ou até mesmo separado da preocupação com os pobres. “Isso é um erro. O primeiro mandamento que Cristo nos deu foi adorar somente a Deus. A liturgia não é um encontro com amigos. A nossa primeira tarefa é adorar e glorificar a Deus na liturgia e também em nosso modo de vida. A partir de uma verdadeira adoração e amor a Deus cresce o amor pelos pobres e por nosso próximo. Essa é uma consequência.”
A opinião do bispo foi moldada pelos primeiros anos de sua infância, crescendo como um católico alemão perseguido na União Soviética, onde ele tinha que frequentar aulas de ateísmo na escola. Seu livro Dominus Est revela como a comunidade católica alemã manteve viva a sua fé apesar de graves dificuldades e perseguição. Em sua própria experiência, sua mãe e tia-avó se arriscaram muito por sua fé e em nome de outras pessoas na comunidade. Assim, Dom Schneider e sua família ficaram horrorizados pelas atitudes e práticas liberais no Ocidente, especialmente com relação à Sagrada Comunhão, que havia sido tão rara e tão preciosa para os católicos alemães perseguidos da União Soviética.
De modo semelhante ao menininho na história da Roupa Nova do Imperador, o bispo agora sente-se impulsionado a falar claramente e não consegue entender porque as outras pessoas não fazem o mesmo. “Parece que a maioria dos padres e dos bispos estão contentes com este uso moderno da Comunhão na mão… Para mim isso é inacreditável. Como é possível, quando Jesus está presente nas pequenas Hóstias?”
Ele continuou: “Há um fato doloroso da perda dos fragmentos eucarísticos. E os fragmentos da Hóstia consagrada são esmagados pelos pés. Isso é horrível! Nosso Deus é pisoteado em nossas igrejas!”
Dom Schneider admitiu que está “muito triste por sentir-se gritando no deserto”.
Ele disse: “É hora dos bispos levantarem suas vozes por Jesus Eucarístico, que não tem voz para se defender. Aqui está um ataque ao Santíssimo, um ataque à fé eucarística.”
Mas apesar de seus receios, Dom Schneider não é pessimista e acredita que já existe uma onda de apoio aos valores tradicionais que renovarão a Igreja com o tempo: “Os pequeninos na Igreja têm sido deixado de lado e negligenciados”, disse. “[Porém] eles têm mantido a pureza de sua fé e representam o poder verdadeiro da Igreja aos olhos de Deus e não daqueles que estão no controle.
“Falei aos jovens estudantes em Oxford e fiquei tão impressionado com esses estudantes. Fiquei tão contente de ver a sua pureza, fé e convicções, e a clara mentalidade católica. Isso irá renovar a Igreja. Assim, estou confiante e esperançoso também com relação a esta crise na Igreja. O Espírito Santo vencerá esta crise com este pequeno exército.”
E acrescentou: “Não estou preocupado com o futuro. A Igreja é a Igreja de Cristo e Ele é a cabeça real da Igreja, o Papa é somente o vigário de Cristo. A alma da Igreja é o Espírito Santo e Ele é poderoso.”
O livro de Dom Athanasius Schneider Dominus Est: É o Senhor! foi publicado pela Newman House Press. Sua obra Corpus Christi: Holy Communion and the Renewal of the Church [A Sagrada Comunhão e a Renovação da Igreja], foi publicado pela Lumen Fidei Press