domingo, 18 de abril de 2010

O Bom Pastor.

 
João Maria Vianney tomou consciência de sua grande responsabilidade de vigário: “Se o padre estivesse plenamente consciente da grandeza de seu ministério, só isso valeria”. Ele se reconhecia o representante de Deus diante de seus 230 paroquianos, mas, acima de tudo, representante deles perante Deus: “Deixai uma paróquia vinte anos sem vigário, e os animais passarão a ser adorados”. Exortava frequentemente os paroquianos a se converterem, mas estava convencido de que eles não o fariam sem sua ajuda permanente, sem suas orações mais fervorosas. Como muito pouco sabiam do que significava amar a Deus, pensava ser sua competência suprir o que neles faltava. Aí estava uma das razões de suas preces, de sua penitência, de suas preocupações: “Se eu soubesse tudo o que teria de enfrentar sendo Cura, teria morrido de tristeza. Não estou agastado de ser padre para celebrar a Santa Missa, mas não gostaria de ser vigário… estou enfadado… De que temor não deve ser tomado um pobre padre diante de um ministério tão extraordinário!…”.
Na primavera de 1818, começou a confiar nos que julgava melhores. Convidou três ou quatro mulheres mais velhas para freqüentar a missa dos dias de semana e lhes propôs comungarem diariamente. Ensinou-as a rezar o Rosário da Virgem Maria. Incentivou-as a reunir as crianças que ficavam entregues aos cuidados das avós enquanto as mães trabalhavam. Seis meses após sua chegada, esse pequeno grupo já se reunia aos domingos de manhã no jardim da casa paroquial. Rezavam, cantavam e ouviam o Cura. Acabaram formando a “Confraria do Rosário”. Dois ou três anos depois, congregava não só velhas e crianças, mas também esposas, mães e jovens, que renunciavam ao prazer da dança.
Era verdade: o Cura não gostava nada da dança dominical, nem dos dançarinos. Abominava, acima de tudo, a frivolidade dos costumes.
Pouco tempo depois de sua chegada a Ars, celebrou o primeiro casamento. Fato banal e até mesmo feliz? Podia ser… Mas… o noivo tinha apenas 18 anos, e a noiva, 14! Três meses depois celebrava o Batismo do filho deles. Ele sabia como os jovens gostavam de se reunir na pracinha atrás da igreja, o “Disfarce”, e que essas reuniões estavam sendo ocasião de desordens. Os jovens ficavam ouvindo música a tarde inteira, “quase todo domingo”, escreveu Catarina Lassagne, e acrescentou: “A presença do Cura ainda não conseguiu modificar este hábito. Somente aos poucos é que ele vai-se extinguindo”. João Maria Vianney intervinha, falava-lhes da presença de Jesus na Eucaristia, no Sacrário, na igreja… “Ah! Se tivéssemos fé, se estivéssemos bastante compenetrados da presença de Nosso Senhor nos altares com suas mãos repletas das graças, buscando distribuí-las, com que respeito nos comportaríamos em sua presença!”. Uma testemunha declarou: “As moças, então, começaram a sentir-se pouco à vontade quando se divertiam a poucos metros da igreja, que já não era mais para elas um monumento qualquer, mas uma casa onde verdadeiramente habitava o bom Deus”.
O Cura convenceu alguns pais e mães de família, em especial o prefeito e alguns membros do Conselho Municipal a decidir que não haveria mais bailes no “Disfarce”, por ser muito perto da igreja. Os bailes que viessem a ocorrer seriam realizados na periferia da aldeia. O prefeito transformou o “Disfarce” em depósito de areia e cascalho. Alguns rapazes, inconformados, roubaram o material. O prefeito ameaçou-os com multa, mandando anunciar-lhes a medida, através de seu guarda-florestal ao som do tambor!
Finalmente voltou a calma. Os bailes tornaram-se mais raros em Ars e as moças, pouco a pouco, foram deixando de comparecer. Os rapazes custaram a se conformar, já que tinham de freqüentar os bailes das aldeias vizinhas.
João Maria Vianney era radicalmente contra bailes e danças porque via nisso ocasiões favoráveis à luxúria e à impureza, “esses pecados que os demônios nos fazem cometer, e que eles próprios não cometem”. Sua experiência de vigário o autorizava a dizer: “De todos os pecados, o da impureza é o mais difícil de arrancar. Quão difícil é corrigir-se inteiramente!”. Antes de condenar, porém, preferia exaltar a pureza do coração e do corpo: “Ser rei… triste situação: a pessoa é rei para os homens! Mas estar em Deus, estar em Deus todo inteiro, sem reservas, o corpo em Deus, a alma em Deus!… o corpo casto, a alma pura… nada há de mais belo!”.
João Maria Vianney lançou-se, em seguida, contra os beberrões. Havia um botequim muito perto da igreja, no largo do “Disfarce”. A desativação dos bailes fez com que ele perdesse quase toda clientela domingueira. Ficaram uns poucos beberrões. “Nós afogamos, nós asfixiamos nossa alma no vinho”, bradava ele. O dono do botequim viu-se na contingência de aceitar a ajuda de João Maria Vianney, ele que havia dito que o Cura havia pago para fechar o botequim!
João Maria Vianney: o cura d’Ars – Marc Joulin, 6. ed. – São Paulo: Paulinas, 2009, PP. 57-58

fonte:fratres in unum