sábado, 5 de junho de 2010

S,Afonso de Ligório: Devem os sacerdotes ser santos, para não desonrarem o Deus de quem são ministros, e estão encarregados de honrar: Serão santos na presença de Deus e não mancharão o seu nome.Quanto a Deus, todos os padres devem viver numa perfeita união com ele e procurar, mediante a oração, que os seus corações sejam outros tantos altares, em que arda de contínuo o amor divino.


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V
Conseqüências práticas
Considerando tudo quanto fica dito, conclui o Doutor angélico que, para
exercer dignamente as funções sacerdotais, é necessária uma perfeição acima
do comum217. Noutro lugar: “Os que se aplicam aos divinos mistérios
devem ser duma virtude perfeita”218. Ainda noutra parte: Para exercer dignamente
estas funções, requere-se a perfeição interior219. Devem os sacerdotes
ser santos, para não desonrarem o Deus de quem são ministros, e estão
encarregados de honrar: Serão santos na presença de Deus e não mancharão
o seu nome220. Se se visse o ministro dum rei a folgar pelas praças públicas,
a freqüentar as tabernas, confundido com o populacho, a falar e proceder
duma maneira desonrosa para o seu príncipe, — que caso se faria desse
soberano? É assim que os maus padres desonram a Jesus Cristo, de quem
são ministros. Segundo o autor da Obra imperfeita, poderiam os pagãos ao
falar deles dizer: Que Deus têm esses que de tal modo se comportam? Acaso
os suportaria ele, se não lhes aprovasse o precedimento?221. Os Chineses,
os Índios, que vissem um padre de costumes desregrados, estariam no
direito de dizer: Como poderemos crer que o Deus que tais sacerdotes pregam
seja o verdadeiro? Se ele fosse o verdadeiro Deus, como poderia, à
vista da má conduta deles, suportá-los sem participar dos seus vícios?
Daqui a exortação de S. Paulo, dirigida aos padres: Demo-nos a conhecer
como verdadeiros ministros de Deus, sofrendo com paciência a pobreza,
as doenças, as perseguições, velando com zelo pelo que respeita à glória de
Deus, e mortificando os nossos sentidos. Conservemos a pureza do corpo,
entregando-nos ao estudo, para sermos úteis às almas, praticando a doçura
e a verdadeira caridade para com o próximo. Pareceremos tristes, em razão
de vivermos afastados dos prazeres do mundo, mas gozaremos sempre da
paz, que é a partilha dos filhos de Deus. Seremos pobres dos bens da terra,
mas ricos em Deus, porque possuir a Deus é possuir tudo222.
Tais devem ser os padres. Devem ser santos, porque são ministros dum
Deus santo223. Devem estar prontos a dar a sua vida pelas almas, porque são
ministros de Jesus Cristo, que veio morrer por nós, ovelhas suas, como ele
próprio declarou: Eu sou o bom Pastor. O bom Pastor dá a vida pelas suas
ovelhas224. Devem enfim empregar todos os esforços para acender no coração
de todos os homens o fogo sagrado do amor divino, porque são ministros
do Verbo encarnado, que para este fim desceu à terra, como ele próprio
nos ensina também: Vim trazer o fogo à terra, e que quero eu senão que ele
se acenda?225
O que Davi pedia com insistência ao Senhor, para bem do mundo inteiro,
era que os padres fossem revestidos de justiça226. Compreende a justiça
todas as virtudes. Assim, todos os padres devem estar compenetrados da fé
e viver, não segundo as máximas do mundo, mas segundo as da fé.
As máximas do mundo são: “É necessário conseguir bens e riquezas; é
necessário procurar a estima dos homens; é necessário gozar quanto possível”.
As máximas da fé são: “Feliz o pobre; é preciso abraçar as humilhações,
renunciar a si mesmo, amar os sofrimentos; é necessário estar animado duma
santa confiança, esperar tudo, não das criaturas, mas de Deus somente; é
necessário ser humilde, julgando-se digno de toda a pena e desprezo; é preciso
ser manso, praticando a doçura para com todos, principalmente para
com as pessoas melindrosas e grosseiras; é preciso enfim estar-se revestido
de caridade para com Deus e para com os homens. Quanto a Deus, todos os
padres devem viver numa perfeita união com ele e procurar, mediante a oração,
que os seus corações sejam outros tantos altares, em que arda de contínuo
o amor divino. Para com os homens, todos devem praticar o que diz o
Apóstolo227: Tomai entranhas de misericórdia, vós, eleitos de Deus, santos e
caros a seus olhos. Devem quanto possível prestar a todos os homens socorros
corporais e espirituais; a todos, digo, mesmo aos mais ingratos e aos
perseguidores.
Santo Agostinho dizia: Nada mais ditoso cá na terra, nem mais agradável
aos homens que o ofício de padre; mas aos olhos de Deus nada mais
miserável, nem mais triste, nem mais arriscado para a salvação228. É grande
felicidade e honra para um homem ser padre: poder fazer baixar do Céu às
suas mãos o Verbo encarnado, e livrar as almas do pecado e do inferno; ser
vigário de Jesus Cristo; ser a luz do mundo e o mediador entre Deus e os
homens; ser maior e mais nobre que todos os monarcas da terra; ter um
poder superior ao dos anjos; ser numa palavra um Deus terreno, conforme a
expressão de S. Clemente229. Nada mais venturoso, mas por outro lado nada
mais terrível. Com efeito, se Jesus Cristo desce às suas mãos para seu alimento,
é preciso que o padre seja mais puro que a água que foi mostrada a
S. Francisco; se é o mediador dos homens diante de Deus, é preciso, para se
apresentar diante do Senhor, que seja isento de todo o pecado; se é o vigário
do Redentor, é preciso que lhe seja semelhante na vida; se é a luz do mundo,
é preciso que seja todo resplendor de virtudes. Numa palavra, se é padre, é
necessário que seja santo; de contrário, se não corresponde aos dons recebidos
de Deus, quanto maiores são esses dons, diz S. Gregório, mais rigorosa
será a conta a prestar230. S. Bernardo diz do padre: Está ele encarregado
dum ofício celeste, é o anjo do Senhor; mas é também como os anjos eleito
para a glória, ou réprobo e condenado ao fogo231. Por isso Sto. Ambrósio
ensina que o padre deve ser isento até dos mais leves defeitos232.
Donde se segue que, se um padre não é santo, está em grande perigo
de se condenar. Mas que fazem alguns padres, ou melhor, a máxima parte
dos padres, para se tornarem santos? Recitam o ofício, celebram a missa, e
nada mais: nem oração, nem mortificação, nem recolhimento.
Basta que me salve, dirá algum. — Ó, não, responde Sto. Agostinho, se
dizes: Basta, pereceste233. Para ser santo, deve o padre ser desapegado de
tudo, — dos ajuntamentos do mundo, das honras vãs etc., e em especial do
afeto desordenado a seus pais. Estes ao verem o sacerdote pouco interessado
no engrandecimento da família, e todo entregue às coisas de Deus, dirão
talvez: Por que procedeis assim conosco? — Quid facis nobis sic? Deverá ele
responder como o menino Jesus, quando encontrado por sua Mãe no templo:
Quid est quod me quaerebatis? nesciebatis quia, in his quae Patris mei
sunt, oportet me esse? (Luc. 2, 49). O padre responderá a seus pais: Foste
vós que me fizestes sacerdote? Não sabíeis que o padre não deve trabalhar
senão para Deus? É só a Deus que eu quero dedicar todos os meus cuidados.