O Santo Cura d’Ars sempre manifestou a mais alta consideração pelo dom recebido. Afirmava: “Ó, que grandioso é o sacerdócio! Só se compreende bem no Céu… mas se o compreendesse sobre a terra, morrer-se-ia, não de temor, mas de amor” (Abbé Monnin, Esprit du Curé d’Ars, p. 113). Além disso, quando criança, tinha confiado a sua mãe: “Se eu fosse padre, conquistaria muitas almas” (Abbé Monnin, Procès de l’Ordinaire, p. 1.064). E assim foi. No serviço pastoral, tão simples como extraordinariamente fecundo, este anônimo pároco de uma distante aldeia do sul da França conseguiu de tal modo identificar-se com o seu ministério que se tornou, de uma maneira visivelmente reconhecível, alter Christus, imagem do Bom Pastor, que, diferentemente dos mercenários, dá a vida por suas ovelhas (cf. Jo 10:11). A exemplo do Bom Pastor, ele deu a vida nos decênios de seu serviço pastoral. Sua existência foi uma catequese viva que adquiria uma eficácia particularíssima quando as pessoas o viam celebrar a missa, deter-se em adoração diante do sacrário ou passar muitas horas no confessionário. [...] Os métodos pastorais de São João Maria Vianney poderiam parecer um pouco distantes das atuais condições sociais e culturais. Como poderia imitá-lo um sacerdote hoje, em um mundo tão mudado? Se é verdade que mudam os tempos e muitas características são típicas de cada pessoa, às vezes irrepetíveis, há no entanto um estilo de vida e um alento fundamental que todos somos chamados a cultivar. Na verdade, o que fez santo o Cura d’Ars foi a sua humilde fidelidade à missão a que Deus o chamou, foi seu constante abandono, cheio de confiança, nas mãos da Divina Providência. Ele conseguiu tocar o coração das pessoas não com a força de seus talentos humanos, ou através de um louvável esforço da vontade; conquistou as almas, mesmo as mais resistentes, comunicando-lhes aquilo que vivia internamente, que era a sua amizade com Cristo. [...]
Longe de diminuir a figura de São João Maria Vianney a um exemplo, embora louvável, da espiritualidade devocional do século XIX, é necessário, por outro lado, compreender a força profética que marca sua personalidade humana e sacerdotal de uma altíssima atualidade. Na França pós-revolucionária, que experimentava uma espécie de “ditadura do racionalismo”, empenhada em apagar a presença dos padres e da Igreja na sociedade, ele tinha vivido anteriormente –nos anos de juventude– uma heróica clandestinidade percorrendo quilômetros pela noite para participar da Santa Missa. Depois –como sacerdote– distingue-se por uma singular e fecunda criatividade pastoral, pronta a demonstrar que o racionalismo, então imperante, era na realidade distante de satisfazer as necessidades autênticas do homem.
Queridos irmãos e irmãs, 150 anos após a morte do Santo Cura d’Ars, os desafios da sociedade moderna não são menos exigentes, talvez até se tornaram mais complexos. Se naquele tempo havia a “ditadura do racionalismo”, hoje se registra em muitos ambientes uma espécie de “ditadura do relativismo”. Ambas lançam respostas inadequadas à justa procura do homem por usar de modo pleno a razão como elemento distintivo e constitutivo da própria identidade. O racionalismo foi inadequado porque não levou em conta os limites humanos e aspirou a elevar apenas à razão a mistura de todas as coisas, transformando-as em uma ideia; o relativismo contemporâneo mortifica a razão, porque de fato chega a afirmar que o ser humano não pode conhecer nada com certeza além do campo científico positivo. Hoje, como então, o homem, “mendicante de significado e completude”, sai em contínua busca das respostas exaustivas às questões de fundo que não cessam de se colocar.
Audiência Geral do Papa Bento XVI aos peregrinos em Castel Gandolfo, 04 de agosto de 2009.
No Rito Romano Tradicional, a festa de São João Maria Vianney é celebrada em 8 de agosto